Artigo Revisado por pares

O estranho horizonte da crítica feminista no Brasil

1994; Volume: 7; Issue: 14-15 Linguagem: Português

10.1353/ntc.1994.0002

ISSN

1940-9079

Autores

Heloísa Buarque de Hollanda,

Tópico(s)

Literature, Culture, and Criticism

Resumo

O ESTRANHO HORIZONTE DA CRÍTICA FEMINISTA NO BRASIL ___________HELOISA BUARQUE DE HOLLANDA___________ Universidade Federal de Rio de Janeiro As teorías críticas feministas estáo experimentando um momento bastante interessante. Nos países de formaçâo saxónica, especialmente nos USA, conseguiram uma certa legitimidade académica e constituem-se como uma inegável tendencia dentro do mercado editorial. Muitos centros de women 's studies se formaram dentro das Universidades, desde a segunda metade dos anos 70, e seu projeto é claramente intervencionista e político-académico . Na Franca, já o quadro é relativamente diverso. Os estudos feministas, cuja facçâo mais representativa e internacionalmente reconhecida é ligada à psicanálise, recusam a filiacáo institucional dentro das Universidades e preferem formas de organizaçâo independentes ou, pelo menos, desvinculadas da produçâo de académica oficial. De um modo geral, a formaçâo desta área de conhecimento está intimamente ligada aos movimentos políticos dos anos 60, mas vai ganhar estatuto académico um pouco mais tarde, no contexto da consolidaçâo das teorías pós-estruturalistas e desconstrutivistas, cuja desconfiança sistemática em rela çâo aos discursos totalizantes passa a ter uma posiçâo central no debate teórico conhecido como pós-modernista. É neste terreno —coexistindo com formaçôes disciplinares emergentes como o novo historicismo, a historia das mentalidades e os estudos pós-coloniais — que se move, e ganha prestigio, a maior parte do pensamento crítico feminista internacional desenvolvido a partir da segunda metade da década de 70. Este pensamento, entretanto, revela certas especificidades em rela çâo ao quadro teórico no qual, de certa forma, se insère. Passado o momento inicial de crítica do desagravo e de denuncia da lógica patriarcal ñas relacóes de género, as teorías críticas feministas começam a mover-se em direçâo a uma perspectiva mais sutil e talvez mais radical, batizada por Jean Franco como a luta pelo poder interpretativo} ou seja, uma luta, bastante precisa, no interior de campos epistemológicos, no interior da propria lógica das formaçôes discursivas. Se as novas teorías antitotalizadoras falam de uma crise da representaçâo, o feminismo fala exatamente da necessidade de uma lutapela significaçâo. Por outro lado, num momento em que se apregoa©1995 NUEVO TEXTO CRITICO Vol. VII Nos. 14-15, Julio 1994 a Junio 1995 260_____________________________________HELOISA BUARQUE DE HOLLANDA o fim da historia, do social e do político, a crítica feminista passa a insistir na articulaçâo de suas questöes com as determinaçôes históricas e poh'ticas. Aínda que nâo excludentes, as teorías feministas e o pensamento pós-moderno parecem apontar, com clareza, para diferentes campos de contesta çâo. Entretanto, atualmente, apesar da efervescencia e do avanço do debate teórico feminista, pode-se perceber alguns sinais de confinamento e declinio da área, na forma como foi configurada originalmente, ainda que esta esteja longe de ter esgotado suas potencialidades políticas e epistemológicas. Come çam a ser discutidos mesmo certos aspectos da prática da crítica feminista nos países centrais onde, como observa Gayatri Spivak, a reproduçâo de axiomas imperialistas denunciaría uma possível cumplicidade entre o pensamento feminista metropolitano e certas ideologías racistas e colonialistas. Com a palavra, portanto, estariam agora os estudos sobre a mulher ñas sociedades periféricas, capazes de trazer para o centro da cena feminista dominante temas como o racismo, o anti-semitismo, o imperialismo, o colonialismo , a ênfase ñas diferenças de classe, e,principalmente, a possibilidade de interpelaçâo dos atuais modelos teóricos feministas. Estaría ainda ñas máos destes estudos, a responsabilidade da discussäo acerca do surgimento de um ideario pluralista, subsidiario da economía de mercado. O ponto principal dessa discussäo seria o questionamento do pluralismo neo-liberal e da consagra çâo de uma falaciosa "retórica da diferença", que estaría, na realidade, bloqueando o sentido real de uma "política da diferença", capaz de restituir às margens, seu valor polémico. A partir deste panorama, nao é difícil perceber como os estudos...

Referência(s)