Artigo Produção Nacional Revisado por pares

A dialética da centralidade do trabalho

2006; Brazilian Society for the Advancement of Science; Volume: 58; Issue: 4 Linguagem: Português

ISSN

2317-6660

Autores

Wolfgang Leo Maar,

Tópico(s)

Urban and sociocultural dynamics

Resumo

1. O SENTIDO DA CENTRALIDADE DO TRABALHO A questao da centralidade do trabalho precisa ser elaborada com cautela, para evitar parâmetros maniqueistas para o problema, ao contrapor as posicoes contrarias apenas no plano do discurso. De um lado, nao cabe se fixar apenas na propalada – verdadeira – tendencia factual re g re s s i va do trabalho na sociedade presente, sob pena de unicamente fazer eco a ideologia capitalista. Nem tampouco procede insistir numa mera defesa da centralidade do trabalho – verdadeira – idealizada para alem da sociedade em sua formacao real vigente, com o risco de re s va l a r somente num essencialismo ahistorico. Em ambos os casos, move m o n o s num ambiente de abstracao das determinacoes sociais em suas formacoes efetivas, abstracoes que resultam em diminutas contribuicoes a elucidacao adequada do tema em pauta. Evitar essas abordagens significa superar uma posicao positiva, embora conformista, no primeiro caso; e critica-negativa, porem idealista, no segundo. O tema da centralidade do trabalho precisa ser focalizado tendo em vista o processo de producao e reproducao material da vida humana em sociedade, em sua interacao com os outros homens e com a natureza. Neste processo os homens produzem a si proprios, a sociedade e as proprias formas sociais em que produzem. O trabalho social tem uma dupla “natureza”: ele e tanto o trabalho envolvido no processo de producao da sociedade em que se trabalha, que determina socialmente, quanto o trabalho concreto na sociedade vigente, socialmente determinado. Marx se refere a essa questao no capitulo sexto inedito de O Capital. “(...) os economistas burgueses, enredados nas ideias capitalistas, veem sem duvida como se produz no interior da relacao capitalista, mas nao como se produz esta relacao propriamente dita (...)” (2). Contudo o unico acesso a “e s s e n c i a” ocorre pela via da aparencia, que nao e imagem ilusoria, mas forma real efetiva da essencia. Isto e, o acesso ao trabalho como forma do metabolismo entre os homens em sua vida social e a natureza, e que e produtor d a sociedade, ocorre a partir de uma a p reensao critica das formas sociais determinadas do trabalho n a s o c i edade vigente. O sentido da questao da centralidade do trabalho esta em sua relacao com a sociedade. Por mais que haja consciencia das condicoes que, pela centralidade do trabalho na formacao social vigente, alienam os homens do proprio p rocesso de trabalho, subordinando-os ao mesmo em vez de possibilitar que, por seu intermedio, se formem enquanto sujeitos; por mais que assim se delimitem com clareza as acoes praticas capazes de promover a transformacao pretendida nesta relacao entre sociedade e trabalho como uma possibilidade objetiva; isso nao basta. E preciso principalmente estabelecer os nexos desse objetivo com a realidade efetiva. So assim sera possivel conferir materialidade a pratica e nao incorrer nos equivocos apontados acima. Nessa medida cabe decifrar como a questao do trabalho e sua centralidade estao presentes nas formas concretas e contraditorias da reproducao social vigente. Conforme exposto a seguir, a sociedade do trabalho e determinada a partir de sua base economica pela perspectiva da acumulacao do capital, e e determinante seja dos individuos que atuam e trabalham na sociedade, seja das suas relacoes sociais, seja das suas relacoes com a natureza. A partir dessa situacao concreta, invertida em relacao ao trabalho, o mesmo precisara ser decantado como elemento contraditorio essencial a re p roducao da sociedade por um prisma humano. Isto foi caracterizado por Kant em sua Fundamentacao da metafisica dos costumes, onde contrapoe a sociedade em que tudo tem um preco e os fins sao contrapostos aos homens e a sociedade em que se efetiva a dignidade humana, onde os homens sao fins em si mesmos. Por esse prisma pode-se configurar, como contraponto a sociedade vigente do trabalho, da formacao social pela perspectiva do capital e suas determinacoes, uma configuracao da sociedade pela perspectiva do trabalho, um “modelo” de sociedade contraposto e critico em relacao aquele do modo de producao capitalista. O sentido humanista, emancipatorio, da centralidade do trabalho, nao se efetiva na sociedade do trabalho, mas em uma sociedade pela perspectiva do trabalho. Nesta ultima o trabalho social nao se vincula, como ocorre na sociedade do trabalho, a alienacao nas relacoes entre os homens, nem a alienacao nas relacoes com a natureza. A centralidade do trabalho diz respeito, nesses termos, a critica as formas sociais determinadas na formacao vigente. Ou seja: critica ao economicismo que instrumentaliza as relacoes sociais em termos de produtividade capitalista; a mercantilizacao generalizada, que subordina a vida social ao consumismo e aos ditames da industria cultural; a destruicao ambiental resultante de uma relacao com a natureza objetivada em materia de exploracao predatoria; a politica instrumental que subordina a ampliacao dos direitos sociais a mera circulacao no acesso aos mecanismos de poder, etc..

Referência(s)