Entendimento humano da experimentação animal
2008; Brazilian Society for the Advancement of Science; Volume: 60; Issue: 2 Linguagem: Português
ISSN
2317-6660
Autores Tópico(s)Animal testing and alternatives
ResumoO volver do olhar a Idade Media e ao Renascimento revela a importância que a disseminacao do conhecimento teve na visao que o homem faria de si. Na historia da medicina observa-se que as doencas e as aflicoes humanas foram tratadas e consideradas no âmbito da magia e da religiao. Com a insercao do racionalismo (seculo V a.C.), Hipocrates redesenha a medicina dando forma as causas das doencas, identificando sua origem em fatores naturais e no modo de vida. De Hipocrates a Francis Bacon (1561-1626), e deste aos dias de hoje, houve intensa movimentacao social (economica, politica, cultural). Os ideais de Bacon romperam com a visao aristotelica de que as excecoes nao sao relevantes para serem estudadas. Bacon entendia que a compreensao das excecoes libertaria o intelecto e, para ele, a proposta era clara: a partir da experiencia, a ciencia e a tecnologia assegurariam o progresso da sociedade. Pode-se inferir que seus ideais dariam forma ao que hoje conhecemos como laboratorios de pesquisa. A Revolucao Industrial gerou o desenvolvimento das cidades e, com ele, a probabilidade de aumento de doencas transmissiveis. E nesse cenario que a busca pelas bases fisiopatologicas das doencas estabelece clima propicio para o surgimento da experimentacao animal. Francois Magendie (1873-1855) e seu sucessor, Claude Bernard (1818-1878), impulsionaram o uso de animais na experimentacao e contribuiram para o desenvolvimento da fisiologia e farmacologia. Porem, o questionamento acerca da relacao do homem com os animais e anterior. Montaigne (1533-1595) questionava se “(...) a falha que impede nossa comunicacao reciproca tanto pode ser atribuida a nos como a eles, que consideramos inferiores. Esta ainda por se estabelecer a quem cabe a culpa por nao nos entendermos, pois se nao penetramos os pensamentos dos animais, eles tampouco penetram os nossos, e podem assim nos achar tao irracionais quanto nos os achamos”. Jeremy Bentham (1748-1832) discutia a capacidade que animais tem de sofrer. Portanto, as reflexoes eticas e morais da utilizacao de animais e antiga. A utilizacao de animais na investigacao cientifica e pratica comum no meio academico e tem em seus opositores a argumentacao de que os animais tem direitos, desejos e interesses sendo, portanto, sujeitos de suas vidas. Neste sentido, os grupos opositores entendem que o uso de animais e decorrente de atitude preconceituosa e de carater especista. Ainda, alguns alegam que a experimentacao animal nao trouxe beneficio para a sociedade. Todavia, nao se pode negar que o uso de animais em experimentacao trouxe inegavel melhoria da qualidade de vida dos animais, sejam eles humanos ou nao humanos. De fato, e visivel que a experimentacao animal promoveu, direta ou indiretamente, significativo crescimento no desenvolvimento de medicamentos contra a Aids, na geracao de antibioticos, de farmacos antipsicoticos, medicamentos contra a artrite, câncer, diabetes, doenca de Alzheimer, valvopatias – doencas de valvulas cardiacas –, esquizofrenia, hepatite, fibrose cistica, lesoes de medula e cerebro, hipertensao arterial. A experimentacao animal tem contribuido de maneira significativa para o desenvolvimento e aprimoramento de procedimentos cirurgicos, quimioterapicos, vacinas. A consequencia imediata do progresso determinado pelo uso de animais na ciencia e atestada pelo aumento, no seculo XX, de aproximadamente 23,5 anos na expectativa de vida da populacao. Animais sao utilizados na experimentacao cientifica por constituirem modelos. Os modelos sao mapas de territorios nao explorados e servem de base para encontrar o caminho de um destino. Na sua falta, chegar ao destino e mais dificil. Como exemplo, modelos experimentais desenvolvidos em animais de laboratorios (na sua grande maioria utilizando ratos e camundongos) sao utilizados na ciencia para o entendimento da origem de doencas (que afligem humanos e nao humanos). Dessa compreensao surgem hipoteses sobre os mecanismos de doencas que, uma vez confirmadas, podem ser revertidas em beneficio da sociedade na forma de novos medicamentos, tratamentos mais adequados de doencas, aperfeicoamento de tecnicas cirurgicas, programas de vacinacao etc. Portanto, no universo da ciencia experimental, o uso de animais gerando o conhecimento e um dos elos da corrente formadora do saber cientifico. Apesar de tudo, existe uma polarizacao entre os experimentalistas que consideram relevante o uso de animais e aqueles que se contrapoem a sua utilizacao. Tal polarizacao pode ser identificada pela impossibilidade de se chegar a um acordo entre um grupo e outro quanto ao carater etico e moral do uso de animais na ciencia. Como resolver esse dilema? Para tentar resolver essa questao podemos recorrer a fala de Socrates a respeito da dificuldade que temos em identificar um criterio nao-subjetivo de apreciacao do comportamento etico. A solucao do dilema deve passar pela obtencao de conclusoes de relativo consenso. Assim, as conclusoes devem confluir naturalmente para o reconhecimento de que a experimentacao animal gera o saber cientifico e que a percepcao do animal de experimentacao como um ser senciente exige do pesquisador uma atitude etica. A necessidade de estarmos constantemente avaliando as certezas do mundo que observamos e essencia do pensamento do cientista. Os dados gerados com o uso de animais na pesquisa basica permitem que cientistas entendam o grau de similitude entre a biologia experimental e os fatos da vida humana. Afinal, a ciencia permanece em constante transformacao. O uso dos animais na experimentacao obedece a criterios eticos, os quais sao construidos dentro de uma visao humana de mundo, onde a experimentacao deve priorizar o bem-estar animal. O entendimento que se tem e a adocao de metodos humanitarios, de tal forma que exista responsabilidade no trato
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