Cineastas indígenas, documentário e autoetnografia : um estudo do projeto Vídeo nas Aldeias

2015; Universidade da Beira Interior, Portugal (UBI) & Universidade Estadual de Campinas, Brasil (UNICAMP); Issue: 18 Linguagem: Português

ISSN

1646-477X

Autores

Juliano José de Araújo,

Tópico(s)

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Resumo

Criado em 1986 pelo indigenista e documentarista Vincent Carelli, o projeto Video nas Aldeias (VNA) objetiva fortalecer as identidades, patrimonios culturais e territoriais dos povos indigenas atraves dos recursos audiovisuais. O VNA atua como uma escola de cinema para os povos indigenas brasileiros por meio de oficinas de formacao em audiovisual realizadas nas aldeias e na sede do projeto, em Olinda, no estado de Pernambuco. Desempenha tambem um papel fundamental como entidade responsavel pela captacao de recursos, producao e distribuicao dos documentarios. Nesse contexto, esta pesquisa analisa 28 documentarios da serie “Cineastas indigenas” realizados entre 1999 e 2011 no âmbito do projeto VNA. Trata-se de seis curtas-metragens e 22 medias-metragens de cineastas indigenas das etnias Ashaninka, Huni Kui, Kisedje, Kuikuiro, Mbya-Guarani, Panara e Xavante. Essa producao audiovisual de nao-ficcao e considerada como uma pratica de autoetnografia no documentario, a medida que ao conceder a câmera para os indigenas lhes e permitido o que dizer, quando, onde e como filmar, a partir de uma perspectiva interna, na qual eles apresentam suas aldeias, seu cotidiano, sua historia, suas festas e rituais, como tambem os problemas sociais que enfrentam. Nesse sentido, a tese propoe a categoria de documentario autoetnografico para o corpus analisado, tendo como questoes norteadoras: Quais sao os procedimentos de criacao, metodos de trabalho e condicoes de realizacao dos documentarios autoetnograficos do projeto VNA? E as posturas eticas, opcoes esteticas e tecnicas neles presentes? Qual a importância desses filmes para as comunidades indigenas que deles participam? Com que finalidade eles sao realizados? A partir da analise filmica, em uma perspectiva textual e contextual, isto e, estabelecendo um dialogo entre elementos internos (imagem, som etc.) e externos dos documentarios (entrevistas com realizadores indigenas, equipe do VNA, sujeitos filmados, conceitos das teorias do cinema antropologico e documentario etc.), apresenta-se o estudo do corpus enfatizando, respectivamente, as dimensoes etica, estetica e politica da producao audiovisual de nao-ficcao do projeto VNA. Considerase essas tres dimensoes do discurso filmico como fundamentais para se compreender melhor a categoria de documentario autoetnografico que, para alem de um conceito dos estudos pos-coloniais, acredita-se constituir em uma tomada de posicao e reflexao do campo do cinema diante dos filmes dos realizadores indigenas. A analise dos documentarios autoetnograficos do projeto VNA revela: um processo de realizacao cinematografica (preparacao, filmagem e montagem) no qual a autoria e compartilhada, sendo a etica um elemento presente em todas as etapas; o emprego e a modulacao de diferentes gestos esteticos com uma forte influencia dos cinemas direto/verdade, mas tambem questoes que emergem com forca na producao audiovisual de nao-ficcao contemporânea, como a encenacao e o uso das imagens de arquivo; o papel politico desempenhado pelos documentarios, tendo em vista que se direcionam aos espectadores naoindigenas, seus enunciatarios, para discutir a relacao entre historia oficial versus historia nao-oficial, a identidade e cultura indigenas, ou ainda para denunciar, reivindicar e lhes dar visibilidade.

Referência(s)