Uma crítica à economia política da terceira via
2004; UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ; Issue: 23 Linguagem: Português
10.1590/s0104-44782004000200018
ISSN1678-9873
Autores Tópico(s)Urban Development and Societal Issues
ResumoNesta resenha, pretendo mostrar como A nostalgia do fordismo, de Ruy Braga, constitui-se em uma obra madura capaz de inspirar a acao politica e teorica dos sujeitos comprometidos com a transformacao do presente. Para tal considero necessario cotejar essa obra com A restauracao do capital, livro publicado pelo mesmo autor em 1997. Braga e professor de Sociologia da Universidade de Sao Paulo (USP) e secretario de redacao da revista Outubro. Como seu amigo e colaborador ha mais de seis anos, discuti com ele muitas das questoes que serao aqui tratadas, preservando a mutua independencia e a autonomia critica. Considerando essas questoes relevantes, nada melhor do que as tornar publicas e estimular um debate sobre os caminhos teoricos abertos pelo autor. Entrei em contato com Braga por meio da revisao de sua primeira obra solo, A restauracao do capital. O livro era extremamente ambicioso, mas nao e essa uma de suas virtudes. Dividido em duas partes, desconstruia, na primeira, as teses sobre a abolicao do trabalho e os argumentos do pos-fordismo, por meio da critica de Habermas, Gorz e Kurz, Piore, Sabel, Aglietta e Coriat. A seguir, na segunda parte, utilizando os conceitos de crise orgânica e revolucao passiva de Antonio Gramsci, explicitava as estrategias de passivacao do Estado e das forcas produtivas: “O neoliberalismo corresponderia ao processo de passivizacao [ sic] no nivel do aparelho e da formas estruturais da intervencao estatal, assim como a reestruturacao produtiva em curso encarnaria esse mesmo movimento no âmbito do sistema das forcas produtivas” (BRAGA, 1997, p. 213). A forca da tese nao se encontra no enfoque dado ao neoliberalismo, muito embora o tratamento a partir das categorias gramscianas seja um exercicio teorico levado a cabo com competencia. Seu vigor esta na politizacao do debate sobre a reestruturacao produtiva. A critica ao pos-fordismo ja havia, e verdade, enquadrado as transformacoes no universo produtivo no conjunto de mudancas economicas que permitiram uma recomposicao da taxa de lucro e da acumulacao do capital (cf. HARVEY, 1992). Faltava ainda ‐ e essa e a contribuicao de A restauracao do capital ‐ enfatizar as dimensoes politicas dessas transformacoes: a reestruturacao produtiva como revolucao passiva capaz de fragmentar e imobilizar a classe operaria. A tese, desenvolvendo-se como analise da relacao de forcas sociais, rompia com o determinismo tecnologico predominante no debate e apresentava-se como critica pratica. Duas resenhas aquela obra merecem comentarios. Em ambas sao ressaltadas a capacidade analitica do autor e sua ruptura com as concepcoes dominantes. Mas elas tambem se destacam por indicar aquilo que seriam os pontos fracos da obra. A primeira delas, de Jesus Ranieri (1997), publicada na Revista de Sociologia e Politica, destaca as imprecisoes conceituais de Braga e a indefinicao de seus conceitos de forcas produtivas e luta de classes, em primeiro lugar: “A dificuldade maior esta no fato de que a partir de um conteudo suposta e abstratamente dado retira a substância verdadeiramente dinâmica do real, na medida em que se parte de um modelo pre-estabelecido (mas que so existe na cabeca do autor) que aglutina no seu interior diagnosticos e posicoes visceralmente distintos: e a realidade que cabe no modelo (de forcas produtivas e luta de classes) e nao o modelo que corresponde a realidade (das forcas produtivas e da luta de classes)” ( idem, p. 214). Na segunda delas, publicada na revista Critica Marxista, Hector Benoit (1997), colocando-se no mesmo campo politico-teorico de Braga, aponta quatro problemas que, segundo ele, mereceriam reparos: o primeiro e a ausencia do tema da crise de direcao da classe trabalhadora como elemento constitutivo da crise orgânica; o segundo e a ausencia de um tratamento mais aprofundado do Marx de O capital, notadamente da secao IV; o terceiro e a utilizacao acritica da leitura de Eric Hobsbawm sobre o seculo XX e o quarto e a presenca de um jargao pos-gramsciano, que Benoit identifica nas citacoes de Andre Tosel e que retirariam forca e clareza do argumento.
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