Artigo Acesso aberto Produção Nacional Revisado por pares

Refletindo sobre o texto a estruturação de dissertações e teses em administração: caracterização teórica e sugestões práticas, de Pedro Lincoln Mattos

2002; Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração (ANPAD); Volume: 6; Issue: 3 Linguagem: Português

10.1590/s1415-65552002000300011

ISSN

1982-7849

Autores

Sylvia Constant Vergara,

Tópico(s)

Education and Public Policy

Resumo

No Encontro da Associacao Nacional dos Programas de Pos-Graduacao em Administracao (ENANPAD) de 2000, Barbara Hemais e eu apresentamos trabalho A Cultura Anglo-Americana na Producao Brasileira: Um Estudo de Intertextualidade de Trabalhos em Estudos Organizacionais. Depois ampliamos nossas reflexoes, que nos levou constatacao de que tinhamos feito um estudo maior do que inicialmente proposto. Tinhamos estudado O Jeito Brasileiro de Publicar em Estudos Organizacionais, titulo pelo qual trabalho - alterado em parte - foi publicado em 2001 na revista Organizacoes & Sociedade.Um de nossos achados foi aquele segundo qual pesquisadores brasileiros preferem nao explicitar sua opiniao sobre que ou quem esta sendo citado, fazendo quando se trata de autores estrangeiros. Ao propor um debate direto entre pesquisadores brasileiros, no qual seus nomes sao explicitados, Revista de Administracao Contemporânea (RAC) busca romper com tradicao. Foi-me solicitado que lesse trabalho enviado por Pedro Lincoln Mattos Direcao da ANPAD, e que apresentasse minhas reflexoes sobre texto, de modo que ambos fossem levados aos leitores da RAC. E que empreendo seguir. Ao fazer critica as formas pelas quais teses, dissertacoes e artigos academicos sao produzidos, assevera que estao presos um formalismo pouco contributivo verdadeira construcao do Eis ai seu desconforto e motivacao para estrutura do seu texto. Ele formula outra proposta, ainda formal: que teses, dissertacoes e artigos academicos sejam estruturados em tres partes. Sao elas: (1) estado da questao; (2) argumentacao; (3) conclusao. Ou, como nos velhos tempos, (1) introducao; (2) desenvolvimento; (3) conclusao. Cada uma das partes propostas pelo tem suas subdivisoes. No cerne do estudo de Pedro Lincoln esta tecnica da argumentacao em visao elaborada por Perelman e Olbrechts-Tyteca, pesquisadores que, em 1992, publicaram pela primeira vez, em Bruxelas, seu Traite de L'Argumentation , qual resgata dialetica aristotelica para rejeitar conceitos como evidencia e recursos calculos e experiencia, tao caros producao cientifica, bem como para refutar distincao entre os juizos de fato e os de valor. Sobre esse ponto, vale acrescentar posicao de Habermas. Para esse autor, pesquisas cientificas sao orientadas por interesses cognitivos, resultando dai uma correspondencia entre e interesse que, no plano logico, corresponde relacao dos julgamentos de fato com os de valor. Dissociar valores e fatos, assevera Habermas, e opor ao ser um dever-ser abstrato. Segundo os filosofos Perelman e Olbrechts-Tyteca, o objetivo dessa teoria [a da argumentacao] e estudo das tecnicas discursivas que permitem provocar ou aumentar adesao dos espiritos as teses que se lhes apresentam ao assentimento. Delimitam seu estudo apenas tecnica que utiliza linguagem para persuadir e para convencer, concentrando-se nos textos impressos. Como informam, nao discutem maneira pela qual comunicacao com auditorio e efetuada, mnemotecnica e elocucao ou acao oratoria. Pedro Lincoln tem razao ao mencionar que, as vezes, teses, dissertacoes e artigos academicos prendem-se aspectos formais e um rol de citacoes, deixando de lado o que quer realmente autor e relevância social do seu trabalho. Sublinhando esse aspecto, vale lembrar Pedro Demo, que sobre ele ja discorreu longamente. E bem conhecida sua referencia a qualidade formal e a qualidade politica da producao cientifica. No entanto, se, como afirma do ora sob reflexao, a preocupacao metodologica tem polarizado, desnecessariamente, as atencoes de estudantes de pos-graduacao, nao se pode deixar de reconhecer que preocupacao metodologica seja tao importante quanto motivacao pelo conhecimento. Talvez por esse motivo tenha proposto argumentacao, um metodo, um conjunto de tecnicas capaz de, segundo ele, alcancar unidade do texto e, nas palavras de Perelman e sua colaboradora, obter adesao do auditorio e influenciar suas acoes. Nao se trata, porem, de um criterio priori para desempatar as teses opostas, fundamento da razao cartesiana, como explicita Michel Meyer no Prefacio obra de Perelman; antes, de um discurso do metodo que analisa argumentos governantes de decisoes, qual aceita o pluralismo, tanto nos valores como nas opinioes. Se, claramente ha de se concordar que os aspectos formais nao devam sobrepujar-se ao conteudo do que se apresenta, fica dificil, no entanto, admitir que academia sugira seus membros, iniciantes ou nao, que pratica metodologica seja, sobretudo, uma pratica de regras metodologicas. Ate onde me e dado perceber, movimento da academia e no sentido de oferecer sugestoes praticas, como faz Pedro Lincoln, conforme explicitado no titulo do seu trabalho. Essas sugestoes da academia sao plurais, isto e, ela nao elegeu um unico tipo de estruturacao - universal, portanto - para que trabalhos cientificos sejam apresentados. Ao aceitar propostas variadas, no entanto, que academia nao faz e deixar de reconhecer necessidade de que nas propostas estejam presentes alguns elementos. Todos eles tambem aparecem na proposta do autor: problematizacao de fatos e de ideias, objetivo, hipotese, justificativa/relevância (finalidade social, perlocucionario de fala), argumentacao propria ou de outros autores e conclusoes. Uma significativa contribuicao do e permitir seus leitores conclusao de que um trabalho cientifico nao deve ser confundido com um resumo desse ou daqueles autores; antes, como uma argumentacao com suporte em outros autores. O fato de ser um relatorio, um relato dos achados e das reflexoes do pesquisador, portanto, um dirigido um auditorio, em funcao do qual qualquer argumentacao se desenvolve, torna-o um linguistico de Aqui, novamente permite seus leitores outra conclusao: linguagens hermeticas, pouco claras, as vezes encontradas, nao permitem facilmente reconhecer no trabalho cientifico relatado, um ato de... comunicacao. Contra essa armadilha e preciso ter cuidado. Finalmente, se, em concordância com autor, pode-se afirmar que (1) um trabalho cientifico deve ser definido a partir de contexto linguistico-comunicativo de construcao do conhecimento e (2) utilizacao de um conjunto de regras metodologicas nao garante essa construcao vale, no entanto, fazer uma ressalva: nao ha como realizar um trabalho cientifico sem um metodo. O da argumentacao, proposto por Pedro Lincoln, guarda nas suas razoes crencas ontologicas e epistemologicas que merecem nossa escuta. Em 1991, percebi que muitos iniciantes formulavam seu problema desligado do referencial teorico que pretensamente suportava e que, nao raro, conteudo da coleta de dados caminhava em outra direcao. Consolidei, entao, uma nota didatica que, em 1997, transformar-se-ia na primeira edicao do livro publicado pela Atlas. O que buscava era chamar atencao para necessaria concatenacao de ideias, que deveria imprimir consistencia ao trabalho. A argumentacao direcionada para problema deveria ser construida com profundidade, coerencia, clareza e elegância. O livro nao tem pretensao de reacender debate em torno de questoes filosoficas e epistemologicas, pois toma como fato seu por parte de pesquisadores. O que livro pretende, assim como artigo aqui analisado, e oferecer sugestoes de ordem pratica. Portanto, espero que tanto os leitores de Pedro Lincoln, quanto os meus, possam posicionar-se ante os debates sobre conflitos metodologicos e epistemologicos, fazer suas escolhas cruciais, realizar suas intencionalidades e contribuir para acervo da producao cientifica existente.

Referência(s)