Um sonho imperial: Constantino e a invenção do cristianismo
2012; National Association of Post-Graduate Research in Social Sciences; Volume: 27; Issue: 79 Linguagem: Português
10.1590/s0102-69092012000200016
ISSN1806-9053
AutoresBreno Rodrigo de Oliveira Alencar,
Tópico(s)Classical Studies and Legal History
ResumoE impossivel ficarmos indiferentes diante dos livros de Paul Veyne. Eles geralmente tem o efeito de estimulo intelectual, quer por quem partilha ou nao suas ideias. O grande merito deste autor esta na sua capacidade em apresentar um tema de maneira que um especialista no mundo romano antigo e um leigo no assunto possam debate-lo. Em uma epoca de hiperespecializacao, preocupar-se em se tornar compreensivel, ou mesmo tornar sua disciplina atrativa, e uma qualidade rara o suficiente para ser sublinhada. Por essa razao o leitor nao ficara desapontado. O estudioso encontrara pontos de vista que pode convida-lo para qualificar o seu, e ao neofito sera oferecido um percurso cronologico e religioso esclarecedor sobre um tema tao complexo que Veyne escolheu para enfrentar: nada menos do que a conversao de Constantino, episodio que abriu caminho para o advento do cristianismo. Cronologicamente o texto inicia-se e conclui-se com duas batalhas: a primeira, e mais famosa, e a de Ponte Milvio (ou Milvia), perto de Roma, onde Constantino elimina seu rival Maxencio, em 28 de outubro de 312. Esta vitoria, que ele atribuiu a protecao do Deus cristao, e o ponto de partida de sua conversao ao cristianismo. A segunda batalha, quase desconhecida do publico em geral, e a do Rio Frio (ou Vipacco, em italiano, na fronteira entre a autal Italia e a Eslovenia), onde Teodosio, imperador cristao de Constantinopla, venceu, em 6 de setembro de 394, Flavius Eugenius, ou “O Usurpador”, que havia tomado o poder no Ocidente. Este ultimo, enquanto fora cristao, havia sido tolerante com os pagaos, especialmente os de Roma. Estas duas batalhas foram em si apenas epifenomenos politicos e militares que permitiram a dois individuos ambiciosos impor ou permanecer a frente do Imperio. Mas estas duas “cabecas quentes” tambem eram igualmente influenciadas por crencas religiosas, cuja analise de Veyne aponta contribuicoes que alteraram a face do mundo romano. Com efeito, e a partir de 312 que Constantino afirmou-se, e cada vez mais, como cristao. E a partir de 392 (com a lei que proibiu os ritos pagaos, publica ou privativamente) e mais ainda em 394 (ano do fim “da reacao paga” tolerada por Eugenius) que o cristianismo se tornou a religiao oficial. Portanto, conclui Veyne, trata-se de um conflito pelo trono que deu ensejo a uma revolucao religiosa – ao contrario do que se pensa –, no qual a proibicao do paganismo seria o resultado de um conflito politico. Metade da obra e consagrada a conversao de Constantino, fato que encerra definitivamente a Era das perseguicoes. Mas sobre este assunto, cre-se que tudo ja foi dito (ou quase tudo), uma vez que muita tinta se usou para descrever Constantino como um personagem calculista, frio; um oportunista que tomou conhecimento da falha de perseguicao; um idolatra sincretico do culto a Apolo; ou um pagao que raramente era sincero com o cristianismo. Veyne, por outro lado, tenta nos convencer que essa e uma visao equivocada e procura defender a opiniao de que Constantino pegou carona nos acontecimentos da epoca. No livro Histoire du christianisme, dedicado a conversao de Constantino, Charle Pietri contornou cuidadosamente o problema, tomando cuidado para nao favorecer nenhuma abordagem especifica. “O episodio da Ponte Milvio”, escreveu ele, “importa muito pouco em si mesmo: o que importa e a roupagem que o principe queria dar-lhe para mostrar a sua epifania brilhante atraves de um compromisso cristao” (Pietri, 1995, p. 196). Veyne nao hesitou, por seu lado, em retomar este assunto que dificulta o historiador obstinado: ele aborda as origens de sua conversao em dois capitulos que apresentam titulos significativos: “Uma obra-prima: o cristianismo” (capitulo 2) e “Outra obra-prima: a Igreja” (capitulo 3). Ao fazer isso, enumera os elementos que conferiam a superioridade do cristianismo em relacao ao paganismo, assim como influenciaram na escolha de Constantino: uma religiao de amor (p. 37), a profissao de fe (pp. 63, 87 e 125), a defesa de uma concepcao sublime do mundo e do homem (p. 38), a qual, por intermedio da figura de seu fundador, um personagem historico datado, demonstra-
Referência(s)