O idiotismo 20/20
2003; Conselho Brasileiro de Oftalmologia; Volume: 66; Issue: 3 Linguagem: Português
10.1590/s0004-27492003000300001
ISSN1678-2925
Autores Tópico(s)Cultural, Media, and Literary Studies
ResumoPode parecer implicância contra uma forma que já estaria "consolidada pelos usos e costumes", uma ranzinzice.Chego até a admitir: posso ser rabugento, mas não "burragento".Afinal, o uso dessa expressão de valores de acuidade visual, embora amplo, mostra um desconhecimento constrangedor sobre suas origens, significados e finalidades.Comecemos do início, para dar justificativa à discussão, aparentemente banal e meramente curiosa.Ao contrário, vejo-a como representando uma luta de valores e de princípios, uma condição de importância simbólica mas, simultaneamente, prática e existencial.De fato, como oftalmologistas, profissionais da preservação e restauração da função visual, usamos como característica mais difundida para quantificá-la um de seus elementos, a capacidade discriminativa de formas, expressa em termos de acuidade visual.As medidas dessa função representam, portanto, a parte nuclear de nossa atuação profissional.Ou, em outras palavras, sendo a visão nossa teleologia (profissional), a acuidade visual é o meio com que nos situamos relativamente aos objetivos práticos da Oftalmologia e nos orientamos para atingi-los.Em síntese, nada mais comezinho do que a utilização de indicadores consistentes para nos comunicarmos sobre ela.Existem duas formas para mostrar valores de acuidade visual; uma, a decimal, redução aritmética da outra, a fracionária.Obviamente, o valor decimal é o mais simples: 1,0 (tomado como unidade de visão normal) resulta de toda fração em que numerador e denominador sejam iguais: 4/4, ou 6/6, ou 20/20, ou qualquer outro, y/y.Assim, também, o valor 0,8 equivale a 4/5; ou 6/7,5; ou 20/25; ou y/1,25y.Note-se que, nessas frações, variaram os denominadores relativamente às primeiras expressões "unitárias".Igualmente equivalentes a 0,8 seriam as frações em que, respectivamente, houvessem variado os numeradores, como 3,2/4; ou 4,8/6; ou 16/20; ou 0,8 y/y.Apenas por convenção é que se resolve fixar o numerador da fração, como representante da distância em que o teste é feito, dando-se o significado da expressão pelo valor do denominador, a distância em que o (menor) optotipo então discriminado deveria ser normalmente percebido.Pela conceituação, a informação de acuidade visual por uma expressão fracionária torna-se, indiscutivelmente, mais rica.Pois, com ela, não apenas se conhece o "resultado" final da medida, mas também o "método" com que foi realizada (a distância ao teste, dada pelo numerador).Um a zero para a expressão fracionária.Mas isso subordina o usuário da fração a um cuidado maior ao referi-la.Não como o honesto (mas ingênuo) interlocutor que informou ter obtido a acuidade visual 20/40 a quatro metros... Ora, justamente aí começa minha idiossincrasia.O que significa o "20" do numerador ?A distância de 20 pés, uma unidade de medida alheia a nosso sistema de mensurações.
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