Na boca do estômago: Conversa com José Celso Martinez Correia
1999; Volume: 12; Issue: 23-24 Linguagem: Português
10.1353/ntc.1999.0003
ISSN1940-9079
AutoresLara Valentina Pozzobon da Costa,
Tópico(s)Cultural, Media, and Literary Studies
ResumoNABOCADO ESTOMAGO Conversa com José Celso Martinez Correia LARA VALENTINA POZZOBON DA COSTA Universidade do Estado do Rio de Janeiro Sempre irreverente, quase sempre insolente, ou, no mínimo, extravagante , o diretor, ator e encenador de teatro brasileiro Zé Celso, como normalmente é chamado, mostra ter plena consciencia e convicçao dos pressupostos teóricos que têm embasado sua obra. De atuaçâo excéntrica e abertamente provocadora em debates de TV sobre o teatro, o diretor da histórica encenaçâo de O Rei da Vela mantém, em seus últimos trabalhos, a mesma assinatura do inicio da carreira. E a assinatura de Zé Celso está ligada à carnavalizaçâo, à inversäo de valores, à exposiçâo dos elementos escamoteados nas relacóes sociais e ao questionamento da legitimidade das instituic óes. E o modo como ele seleciona os textos a serem montados e concebe a criaçao cênica parece nunca perder de vista a "Antropofagia" de Oswald de Andrade. Zé Celso conheceu os textos teóricos do modernista em 1967, quando resolveu montar O Rei da Vela com o grupo do Teatro Oficina. O impacto dessa leitura foi täo forte que modificou sua compreensäo de certos textos clássicos, como As Bacantes, de Eurípides. E fez com que tomasse a Antropofagia como ponto de referencia para pensar a construçâo de uma identidade brasileira. Com très pecas por estrear no Rio de Janeiro, Zé Celso confessa grande alegría com a finalizaçâo da nova ediçâo do filme O Rei da Vela, que reúne cenas da peca, remontada em 1971, mescladas com encenaçôes na praia, trechos de documentarlos históricos e outros filmes. A primeira temporada de O Rei da Vela se realizou no Teatro Oficina, em Sao Paulo, em 1967, trinta anos após sua publicaçao. A alegoría modernista de Oswald de Andrade permaneceu esquecida até que encontrou resson ância num contexto de ditadura militar, no quai a censura levou muitos artistas de teatro, músicos e escritores a escolherem a forma da alegoría, da fábula, em sua criaçao. A opçâo pela alegoría permitía driblar a censura, que liberava as obras sem compreender sua relaçâo com a situaçâo política do país. Assim, abría para os artistas a possibilidade de continuar um diálogo com seu público, ainda que sob essa roupagem alegórica. Hoje, o lança-©1999 NUEVO TEXTO CRITICO Vol. XII No. 23/24, Enero a Diciembre 1999 50_________________________________LARA VALENnNA POZZOBON DA COSTA mentó do filme da peça é esperado com grande expectativa, näo só pelo registro histórico, mas também pela sua alta carga de invençâo estética, com a presença de signos que proporcionarâo outras leituras no contexto atual. A entrevista com Zé Celso ocorreu em dezembro de 1997, nos camarins do Teatro Oficina. Atencioso, calmo e doce, o diretor confirmou a lenda de sua verborragia, esquecendo um cansaço aparente logo no inicio da entrevista , quando, para começar a falar, entoou a música tema de O Rei da Vela. O texto da entrevista foi dividido em subtítulos, seguindo a lógica da conversa com Zé Celso. Um cirandeiro do Nordeste A música tema e seu compositor A minha tribo quando entra na aldeia Indio näofaz carafeia nem deixa aflecha cair Tupy, tupy, or not tupy Näo sei se vou, näo sei se estou, näo sei sefleo Nada disso ainda explico nessafrase or not tupy Tupy, tupy or not tupy "Ser ou nao ser tupy": essa é uma ciranda que foi composta por um cirandeiro do nordeste, falecido no dia 18 de dezembro de 1991, acho, mas que fez essa ciranda para o filme O Rei da Vela. Um cirandeiro de uma cidade chamada Surubim, do interior de Pernambuco; um indio mesmo, um caboclo. Ele compos essa ciranda porque houve uma troca muito grande entre a sua arte e a do Oswald de Andrade. Ele seria uma especie de Picasso popular: é cantor, compositor. Alias, gravou um disco com essa música, que ele mesmo produziu. Ele morava no teatro, era zelador...
Referência(s)