Ética e anti-ética
2009; Universidade da Beira Interior, Portugal (UBI) & Universidade Estadual de Campinas, Brasil (UNICAMP); Issue: 7 Linguagem: Português
ISSN
1646-477X
Autores Tópico(s)Law in Society and Culture
ResumoM documentario, a etica que se tem e que se usa e geralmente uma questao de consciencia pessoal. Noutros campos profissionais, como no jornalismo, ha regras estabelecidas, codigos de conduta – mesmo se os seus limites sao frequentemente ultrapassados. Em cinema, onde as praticas sao mais livres e mais individuais, nao existem regras predefinidas. Pode afirmar-se que, em documentario, a questao etica esta presente em todas as fases de trabalho: desde os contactos pessoais previos, durante a filmagem e permanentemente durante a montagem, na decisao de escolher ou omitir uns ou outros planos, e na definicao de um limite interior ao filme – que geralmente se preocupa em respeitar a imagem daqueles que confiaram na equipa. Cada realizador, a sua maneira, procura honrar essa relacao de confianca, sem perder a capacidade critica e a distância de que depende a sua independencia.A ponderacao etica que percorre este processo nao tem, rigorosamente, nada a ver com a obtencao de autorizacoes escritas ou outras, mero proforma que visa acautelar o realizador/produtor de possiveis diferendos futuros. A autorizacao e uma especie de garantia legal, que funciona para ambos os lados: os participantes sabem tambem que ha limites ao uso das imagens cedidas. Pois nada impede um realizador, ja detentor de autorizacoes, de forcar os limites da confianca e ofender os participantes de um filme: foi o que aconteceu,por exemplo, com Borat (2006), de Larry Charles. Foi o que aconteceu com Frederick Wiseman, cujo documentario Titicut Follies (1967), filmado num hospicio prisional, esteve proibido nos EUA durante 25 anos. O facto de possuir licenca para filmar, dentro da instituicao, nao o salvou da proibicao. Mas a falta de etica estava na instituicao filmada, nao na denuncia do realizador. Tambem o documentario Esta Televisao e Sua (1997), filmado por Mariana Otero na SIC, apesar de ter todas as autorizacoes previas e a aprovacao apos a montagem final, encontrou problemas quando surgiram algumas criticas em jornais franceses e os dirigentes daquela televisao perceberam que aquilo que a eles lhes parecera um retrato natural podia ser interpretado de forma muito negativa por quem estava de fora. Sentiram-se enganados e conseguiram cancelar a ante-estreia portuguesa do filme. No seguimento de varios protestos nos jornais, tiveram que ceder e passar o filme a altas horas, mas antecedido de um aviso do director do canal e seguido duma agressiva entrevista com a realizadora. Estes problemas surgem na fronteira, dificil de situar, entre a auto-imagem que os participantes tem de si proprios (inevitavelmente cega) e a imagem que os outros veem neles (frequentemente moralista ou caricatural). O documentarista trabalha sobre esta ambiguidade como limite etico, como no fio da navalha. Mas mesmo quando um filme e inequivocamente benevolo – como e o caso do documentario Ser e Ter (2002) de Nicolas Philibert – podem surgir problemas. Aqui,
Referência(s)