
Transformações e impacto social das políticas de eliminação de cães e gatos no controle da raiva urbana
2015; Volume: 13; Issue: 3 Linguagem: Português
ISSN
2596-1306
AutoresAdriana Lucia Souto de Miranda, Maria Helena Costa Carvalho de Araújo Lima, Taciana Cássia Silva,
Tópico(s)Virology and Viral Diseases
ResumoO presente trabalho discorre sobre as mudancas tecnicas e sociais nas politicas publicas de diminuicao da densidade populacional de caes e gatos e das suas implicacoes eticas. As acoes de captura e morte de caes e gatos sadios como medida de saude publica demonstram a posicao ambigua dos animais de estimacao na sociedade contemporânea: representados como fontes de afeto, por um lado, e como fonte de risco, por outro. Entre os problemas associados a superpopulacao de animais de estimacao, especialmente os caes, a raiva foi a principal motivacao para o estabelecimento de uma politica oficial de exterminio de animais em situacao de rua em diversos paises. Presente em todos os continentes ha cerca de quatro mil anos, essa importante antropozoonose viral letal tornou-se alvo de iniciativas publicas no final do seculo XIX, quando os estudos de Louis Pasteur associaram a transmissao da doenca aos humanos por caes errantes infectados, especialmente no meio urbano. Ate a decada de 1980, a Organizacao Mundial da Saude (OMS) defendeu com veemencia a adocao de medidas de combate a raiva urbana a partir da eliminacao de caes errantes. Entretanto, a analise dos resultados das operacoes de eliminacao de caes no Sri Lanka demonstrou que, mesmo eliminando entre 35 e 50 mil caes por ano, essas atividades nao alcancaram mais do que 5% da populacao total de caes; alem disso, exames sorologicos realizados nos caes eliminados demonstraram a existencia de anticorpos para o virus da raiva em apenas 4% da amostra. Outra analise retrospectiva dos resultados das campanhas de eliminacao permanente de caes, desta vez realizadas entre 1980 e 1985 em Guayaquil, Equador, demonstrou que mesmo com uma eliminacao que atingisse os niveis de 12 a 25-% da populacao de caes total estimada nao havia uma influencia duravel no tamanho da populacao alvo e nao reduzia a incidencia da raiva canina (WHO/ OMS, 1988). A partir desses estudos, no final da decada de 1980 a OMS comecou a questionar a eficacia do exterminio dos caes errantes. Em parecer emitido em 1992, o Comite de Especialistas em Raiva da OMS concluiu que o metodo de captura e morte de animais errantes nao era eficaz no combate a esta zoonose, pois a alta taxa de reproducao das especies canina e felina tornava a sua eliminacao dispendiosa e ineficaz, alem de gerar reacoes negativas em comunidades que nao aceitavam a medida (OMS, 1999). A partir de tal constatacao, a organizacao passou a recomendar politicas publicas de esterilizacao e vacinacao dos animais. Apesar disso, no Brasil, onde a raiva e endemica, o Ministerio da Saude ainda considera a “captura e eliminacao de caes de rua” como uma importante medida de controle da raiva urbana. (MS, 2010). Nos ultimos anos, as politicas de prevencao calcadas nessa diretriz tem sido alvo de criticas por parte de medicos veterinarios, biologos e protetores de animais, levando a sua proibicao em varias cidades do Brasil. O numero de ONGs, grupos e ativistas pelos direitos animais esta em franca expansao, trazendo a tona discussoes que estavam ate entao restritas a pequenos espacos. Apesar disso, a mudanca nas politicas de controle populacional tem sido motivada por motivos tecnicos, e a ausencia de um debate etico dificulta a implementacao de protocolos de castracao responsaveis. E preciso romper com a logica de pensar os animais como meros agentes da cadeia de transmissao de zoonoses. A pressao da sociedade favorecera a elaboracao de leis e estrategias que visem ao bem estar coletivo, mas sem esquecer os valores eticos de protecao e respeito a vida animal.
Referência(s)