
Verônica e sua autonomia
2015; National Association of Post-Graduate Research in Social Sciences; Volume: 30; Issue: 89 Linguagem: Português
10.17666/3089182-186/2015
ISSN1806-9053
Autores Tópico(s)Labor Movements and Unions
ResumoPaulistana, Veronica tem pouco mais de 30 anos; foi para a Espanha depois de ter deixado uma faculdade e apos ter trabalhado como prostituta “de alto nivel” ainda em Sao Paulo. A diferenca de outras brasileiras, a viagem de Veronica para a Europa en-volveu centralmente a contracao de uma divida. Nis -so ela difere tanto de quem se desloca transnacional-mente com a “ajuda” de redes informais de familiares e afins (com fins expressos voltados para quaisquer mercados, entre eles o mercado sexual) como da-queles casos, especificamente ligados a prostituicao, nos quais “a viagem e realizada de forma voluntaria e autonoma. Nao envolve dividas nem um amplo numero de intermediarios” (Piscitelli, 2012, p. 291). Em entrevista, Veronica disse que deixou o clube no qual trabalhava na Andaluzia e que o julgava insegu -ro especialmente por ter passado por uma situacao traumatica na qual um homem tentou mata-la, ten-do sido posteriormente preso. Em Barcelona, pagou em duas semanas sua divida com a dona do clube que a levou para la. Embora tenha conseguido mu-dar para um local de trabalho mais seguro, ela recla-ma expressamente que faz pouco dinheiro e tambem da exploracao a que esta sujeita. Ela manda dinheiro para a familia no Brasil, esta comprando uma casa e “ajudando” a irma a ir pra Espanha.A trajetoria de Veronica, as condicoes institu-cionais e materiais que delimitam sua trajetoria e suas “escolhas”, o universo de relacoes e representa -coes do qual ela faz parte dos dois lados do Atlân-tico, as percepcoes que tem de si propria – tudo isso levanta um tenso e complexo conjunto de dile -mas sobre “autonomia e desigualdades de genero”. A critica de mais de tres decadas empreendida por teoricas e organizacoes feministas ao pensamen-to politico tem mudado, para dizer o minimo, os modos pelos quais nocoes politicas basicas, tais como individuo e igualdade, engendram modelos normativos de democracia. A comecar pela oposi-cao publico/privado, a explicitacao e a contestacao das multiplas fontes da desigualdade de genero (em meio a outras fontes: as hierarquias intrafamiliares, a divisao do trabalho domestico, a privatizacao das praticas de cuidado, o ideal hegemonico de amor monogâmico, o heterossexismo) trazem dilemas de dificil resposta para quem almeja cenarios demo-craticos substantivos. Isso e de especial relevância para sociedades como as nossas, nas quais convi-vem igualdade e desigualdade e nas quais opera a “acomodacao”, no termo de Biroli, entre igualda-de formal e desigualdades reais; enfim, nas quais “a ausencia de barreiras formais ou de coercao nao corresponde a possibilidades iguais de autodetermi -nacao para os individuos” (pp. 31-32). A prostitui-cao ocupa ai posicao tensa, sempre a reorganizar e polarizar os feminismos de varios matizes, e e par-tindo dela que vou destacar a riqueza dos debates feministas em teoria politica revisitados, ampliados e criticados pela autora. Mais propriamente, e a partir das posicoes da discussao recente a favor ou contra a regulamentacao da prostituicao no Brasil, e bastante atento as autointerpretacoes de Veroni-ca, que vou tentar lancar luz sobre a complexidade implicada na adesao e na critica feminista ao ideal de autonomia.Os debates ao redor da prostituicao podem ser,
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