ATITUDES DE UNIVERSITÁRIOS FACE À INCLUSÃO ATTITUDES OF UNIVERSITY STUDENTS TOWARDS INCLUSION
2016; Wiley; Volume: 16; Linguagem: Português
10.1111/1471-3802.12282
ISSN1471-3802
AutoresFilomeno Afonso Correia Tavares, Ana Paula Loução Martins,
Tópico(s)Disability Education and Employment
ResumoO princípio da diversidade, a dignidade da pessoa humana e o direito universal à educação são extensivos a todos, independentemente da condição física, social ou económica, pressupondo uma educação sem discriminação (arts. 50°, 74° e 78°, Constituição da República de Cabo Verde). Nesse contexto, realizamos um estudo com a finalidade de conhecer a atitude de 72 estudantes do 1° ano da Universidade de Cabo Verde em relação à inclusão das crianças e jovens com Necessidades Educativas Especiais (NEE) na escola regular. Os dados foram recolhidos em maio de 2015 através dum inquérito por questionário. Em termos globais os resultados apontam para uma atitude divergente perante a possibilidade de todos os alunos com NEE estudarem na classe regular e para preocupações relacionadas com os recursos disponibilizados. The principle of diversity, human dignity and the universal right to education are extended to all, regardless of physical, social or economic condition, assuming an education without discrimination (arts. 50, 74 and 78, Constitution of the Republic of Cabo Verde). Within this context, we conducted a survey study to analyze the attitude of 72 first year students of the University of Cabo Verde regarding the inclusion of students with Special Educational Needs (SEN) in regular schools. Results indicate a divergent attitude towards inclusion of all pupils with SEN in regular classrooms and concerns related to the resources that are available. A educação inclusiva de crianças e jovens com Necessidades Educativas Especiais exige mudança nas atitudes dos profissionais e dos membros da sociedade em geral, na formação de profissionais, na consciencialização da sociedade e na criação de ambientes de colaboração entre todos de modo a serem criadas respostas apropriadas às necessidades específicas dessas crianças e jovens (Correia & Martins, 2000). Em particular, a inclusão só se tornará efetiva se o professor tiver uma atitude de predisposição para atender a diversidade na sua sala de aula (Denari, 2011). Esta atitude positiva deve iniciar-se precocemente, pelo que deve haver uma aposta nos cursos de formação de professores (Rodrigues & Lima-Rodrigues, 2011). Neste sentido, é pertinente que as instituições de formação incluam nos planos curriculares dos cursos de formação de professores e de outros profissionais ligados ao ensino, unidades curriculares e/ou seminários temáticos sobre a educação inclusiva, uma vez que a formação poderá criar nos formandos “atitudes e preocupações mais inclusivas” (Santos & César, 2010, p. 179). Neste particular, Denari (2011) refere que a inclusão só se efetivará com: i) atitude favorável dos professores; ii) capacidade do professor ampliar as relações com base nas diferenças na sala de aula e iii) predisposição para os professores atenderem os alunos de forma eficaz. O mesmo entendimento tem Correia (2008), ao considerar que “na sala de aula, as atitudes, os valores e as convicções que são inerentes à filosofia inclusiva também devem estar presentes, fundamentando as tomadas de decisão e a mudança que tal filosofia reclama” (p. 46). Assim, a atitude é fundamental no processo inclusivo porque, tal como refere Rodrigues (2007 2007), “de pouco serviriam os saberes e as competências se os professores não tivessem atitudes positivas face à possibilidade de progresso dos alunos” (p. 19). Em Cabo Verde, a formação dos professores, em matéria de NEE, está contemplada nos normativos e/ou documentos estratégicos de base, nomeadamente no Plano Nacional de Ação de Educação Para Todos (2002), no Plano Estratégico Para a Educação (2003) e na Lei de Bases do Sistema Educativo Cabo-verdiano (2010), entre outros. Contudo, a formação de professores tem sido apontada como uma das barreiras que impedem a resposta adequada aos desafios colocados às escolas regulares cabo-verdianas no atendimento às crianças e jovens com NEE (Tavares, 2009; Tavares & Nunes, 2014). Neste contexto e considerando que a mudança de atitudes é fundamental para o processo inclusivo, e uma vez que ela pode ser influenciada pela formação, pretendemos, com este estudo, caraterizar sentimentos, atitudes e preocupações de estudantes do 1° ano dos cursos de formação de professores da Universidade de Cabo Verde em relação à inclusão de alunos com NEE nas escolas regulares em Cabo Verde. A partir de um erro amostral de 5%, um nível de confiança de 95%, e um percentual máximo de 50%, planeamos uma amostra de 95 estudantes da Universidade de Cabo Verde, inscritos no 1° Ano, ano académico 2014-2015, de três cursos do ramo ensino, dos cursos de formação de professores para o Ensino Secundário, dos campi universitários da Praia e São Vicente. Dos 95 questionários distribuídos, recebemos 72, cujos dados utilizámos neste estudo. A maioria dos participantes é estudante de licenciatura em Línguas, Literaturas e Culturas – percurso Estudos Ingleses (55,6%), é do género feminino (63,9%) e reside no concelho da Praia (63,9%). Globalmente, 95,9% dos participantes têm menos de 30 anos. Para a recolha de dados utilizámos o questionário designado por Escala de Atitude SACIE – Sentiments, Attitudes & Concerns about Inclusive Education (Earle, Sharma & Forlin, 2007). O questionário apresenta duas partes, uma relativa a informação demográfica e outra relativa às atitudes e sentimentos, categorizados através duma escala de tipo likert, com quatro níveis: concordo totalmente, concordo, discordo totalmente, discordo. Antes da recolha de dados foi realizado um estudo piloto. A recolha de dados aconteceu entre os dias 08 e 13 de maio de 2015. Os mesmos foram analisados com recurso à estatística descritiva e inferencial. No que diz respeito à interação com uma pessoa com deficiência 51,4% dos participantes referiu tê-lo feito de forma significativa ou considerável. No dia-a-dia contacta-se que existe uma certa tendência familiar para “esconder” as crianças com NEE em Cabo Verde, o que é preciso combater (Tavares, 2009). Sobre a formação para educar alunos com NEE, a maior parte dos participantes indicou nunca ter frequentado uma formação específica (93,1%). Tendo em consideração que estes estudantes estão matriculados no 1° Ano, poderão, ao longo da etapa formativa, ter a oportunidade de frequentar formação neste domínio. Este dado reflete a situação do país em relação à formação para atender à diversidade. A formação escassa é considerada uma das barreiras para o processo inclusivo em Cabo Verde (Handicap International, 2012; Tavares, 2009; Tavares & Nunes, 2014). Segundo Correia e Martins (2000), o contexto inclusivo exige um novo enquadramento para a formação, uma vez que o novo papel reservado ao professor do ensino regular exige dele formação adequada e constante atualização, de modo a responder às necessidades específicas de cada criança. Assim, ao longo do processo de formação dos professores, os futuros professores devem ser alertados para “a importância das atitudes dos professores para o sucesso da sua intervenção” (Rodrigues & Lima-Rodrigues, 2011, p. 105). Considerando que o conhecimento da legislação e de políticas relativas às crianças com NEE é importante para a intervenção em contexto de diversidade, sublinhamos que de acordo com os dados, os participantes têm nível de conhecimento diversificado, nomeadamente: 5,6% considerou ter conhecimento muito bom; 29,2% bom; 31,9% médio e 27,8% fraco. De referir ainda que apenas 5,6% referiu não ter nenhum conhecimento sobre a legislação e a política específica para as crianças com NEE. Mesmo com este resultado, consideramos que, sendo grande a quantidade da legislação nacional em relação a esta matéria (Handicap International, 2012), há necessidade de uma maior divulgação, de modo a proporcionar um melhor conhecimento a todos os intervenientes no processo inclusivo. No que se refere ao grau de confiança e experiência para ensinar alunos com NEE, mesmo sem experiência letiva para a maioria, 54,2% referiu sentir-se confiante para ensinar alunos com NEE. O sentimento de confiança é importante sobretudo se for reforçado com formação adequada, dado que nalguns casos os professores revelam atitude negativa em relação à inclusão porque consideram que não estão preparados (Tavares & Nunes, 2014). Relativamente a sentimentos, os resultados convergiram em relação a sentir-se bem quando ajuda uma pessoa com deficiência (97,2%), observando-se que nenhum participante discordou com esta afirmação. Este dado é importante na medida em que a cooperação e a colaboração são fundamentos essenciais no processo inclusivo (Maset, 2011). Oitenta e dois porcento dos participantes referiu sentir-se confortável entre pessoas com deficiência e 82% discordou que receia olhar para uma pessoa com deficiência. Embora sem dados longitudinais podemos supor que este resultado estará associado a um maior contato dos cabo-verdianos com a realidade das pessoas com deficiência, na atualidade. A maior parte dos participantes (84,7%) indicou que se sente-se grata por não ser pessoa com deficiência. A maioria dos participantes concorda que alunos com dificuldades de expressão oral (62,5%) e alunos que dependem de cuidados pessoais de outras pessoas (76,4%) frequentem a escola regular. Do mesmo modo, 62,5% dos participantes é de opinião que os alunos que utilizam outras formas de comunicação, nomeadamente Língua Gestual Portuguesa e Braille, devem frequentar a escola regular. Cerca de 81% dos participantes é a favor que, com o apoio necessário, todos os alunos devem estudar na classe regular. Este dado está de acordo com os ideais da inclusão porque incluir não é apenas possibilitar o acesso das crianças com NEE à escola regular (Rodrigues & Lima-Rodrigues, 2011). É necessário criar condições ao nível dos recursos materiais, humanos e financeiros, ao nível das políticas e legislação, das práticas, apoiadas sobretudo na formação adequada, visto que ela influencia de forma positiva a atitude dos professores (Swain, Nordness, & Leader-Janssen, 2012). Quanto a preocupações indicadas pelos participantes, sublinhamos que 61,1% discordou que a carga de trabalho possa aumentar com a presença do aluno com NEE na turma e 63,8% apresentou preocupações em relação à inadequação de recursos e pessoal para acompanhar a inclusão. Esta preocupação é legítima, já que o processo inclusivo necessita de profissionais bem formados e recursos materiais em quantidade e qualidade suficientes, de modo a irem ao encontro das necessidades específicas de cada criança (Correia, 2008). A formação é uma das limitações no processo inclusivo em Cabo Verde (Handicap International, 2012; Tavares, 2009; Tavares & Nunes, 2014), sendo que é preciso melhorar a formação inicial e contínua dos professores e de outros profissionais que em conjunto colaboram na educação inclusiva. Sobre a aceitação dos colegas com NEE na sala de aulas, 86,2% dos participantes é de opinião que estes alunos venham a ser aceites pelos colegas. Consideramos que este dado é relevante porque há necessidade de eliminar o preconceito que alunos com NEE dificultam a programação e os objetivos (Gorgatti, 2005). Os colegas sem NEE aceitam e convivem de forma pacífica com os seus pares com NEE porque através do trabalho cooperativo contam uns com os outros e ajudam-se mutuamente (Maset, 2011). Quanto ao receio de o desempenho académico dos alunos sem NEE ser afetado com a presença dos colegas com NEE na sala, 70,8% dos participantes discordou desta opinião. A presença do aluno com NEE na sala exige, sem dúvida, atenção específica da parte do professor, com atividades previamente planificadas, mas não significa atenção exclusiva ao aluno com NEE e abandono dos restantes. Perante a diversidade, o professor deverá atuar de modo a responder às necessidades de todos os seus alunos, isto é, a turma inclusiva implica o trabalho cooperativo e todos trabalham para atingirem os objetivos. A competição cede lugar à cooperação (Maset, 2011). Setenta e seis por cento (76,4%) dos participantes não concordou que o seu nível de stress aumentasse pelo facto de terem alunos com NEE na sala de aula. Em matéria de competência para ensinar alunos com NEE e a atenção a ser dispensada a todos na sala inclusiva, 84,7% e 72,2%, respetivamente, reconheceram que não têm as competências necessárias para tal e estão preocupados tendo em conta as dificuldades que poderão vir a enfrentar no atendimento a todos os alunos na sala de aula. Estes dados são consequências da deficiente formação dos professores na área de NEE em Cabo Verde, situação que deve ser revista e ultrapassada. Pela análise dos resultados, concluímos que: Globalmente, a educação de crianças e jovens com NEE é hoje uma realidade que não pode ser ignorada e na qual os professores desempenham um papel crucial. Desta forma os resultados deste estudo alertam para a importância de atitudes positivas face à inclusão, bem como para a importância de existirem recursos e serviços de educação especial de qualidade. The authors declare no conflict of interest.
Referência(s)