Artigo Acesso aberto Produção Nacional Revisado por pares

EDUCAÇÃO, TRABALHO E TECNOLOGIA

2016; Centro de Estudos Educação e Sociedade; Volume: 38; Issue: 138 Linguagem: Português

10.1590/es0101-73302016161231

ISSN

1678-4626

Autores

Marcelo Lima,

Tópico(s)

Education and Digital Technologies

Resumo

Educacao, Trabalho e Tecnologia Tese de doutoramento defendida no inicio dos anos 1990 na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) agora encontra o devido lugar com publicacao pela Alinea. Tras estudo unico e fundamental que se refere de maneira atenta e profunda as raizes da historia da educacao profissional no Brasil e no mundo. Dentre os trabalhos que tratam historicamente as relacoes trabalho e educacao este e certamente um dos mais ricos e completos, tanto do ponto de vista teorico quanto historiografico. Trata-se de uma obra proeminente entre os principais autores que fazem da historiografia e do materialismo historico dialetico instrumento analitico indispensavel para compreensao da historicidade da formacao humana da classe operaria. Newton Antonio Paciulli Bryan, na obra Educacao, Trabalho e Tecnologia (2015) traca uma trajetoria da implantacao da escola-fabrica em contraponto a fabrica-escola. Parte das criticas de Marx e de Hodgskim aos processos de (de)formacao profissional que se dao no interior do processo produtivo, advogando que os trabalhadores deveriam assumir o controle do seu saber e de sua formacao. A partir das colocacoes do autor, percebemos que tanto na obra de Hodgskin como na de Marx a socializacao do conhecimento e considerada como poderoso meio para a transformacao social - Hodgskin criou e atuou no Mechanics Magazine e no Mechnic’s Institute de Londres, e, Marx orientou o movimento operario internacional organizado na associacao internacional dos trabalhadores no sentido de lutar por uma nova escola onde a educacao intelectual e fisica se articulasse com o ensino tecnologico e o trabalho produtivo. Infere que, para Hodgskin, na esteira do conceito de alienacao de Marx, a destruicao das relacoes sociais em que o trabalhador detem a posse do instrumento de trabalho garantida pela posse do saber implica profundas e constantes transformacoes no processo de trabalho e no de transmissao do saber. Bem antes da difusao do taylorismo no mundo, como nos informam os trabalhos de Braverman e de Charles Babage, ja alertava que a divisao manufatureira do trabalho torna a execucao do trabalho cada vez mais simples, o que exige cada vez menos formacao especial do trabalhador. Nestes termos, segundo Bryan (2015) para Marx e Hodskin, o que chamamos hoje de educacao profissional, sempre foi muito estrategico na luta capital – trabalho. Nesse sentido, cabe aos trabalhadores controlar o desenvolvimento da estrutura da divisao do trabalho que se da por meio da manutencao de uma formacao hominilateral e uma atuacao politecncia, tal processo engendraria a luta de classes. Considera que, mesmo antes do advento do taylorismo e do fordismo, na transicao do artesanato para a producao industrializada, essas questoes ja estavam colocadas e que os trabalhadores organizados por setores sindicais e produtivos deveriam exercer o cotrole social da difusao dos saberes da e para a producao. Outra grande contribuicao do trabalho de Bryan e trazer uma contextualizacao historica e uma descricao precisa do metodo Della Voz que revolucionou aprendizagem dos oficios. Antes do metodo Della Voz, nao so na Russia, mas tambem no mundo industrial desenvolvido, nao havia modelo de aprendizagem que se colocasse como referencia, tampouco metodo que se colocasse como alternativa e referencia pedagogica transcendente ao ensino tipico das corporacoes de oficio (realizado no espaco domestico) e a aprendizagem assistematica que se dava durante a producao (realizada na fabrica). Um problema superado pelo metodo de Della Voz. A difusao do metodo de Della-voz, atraves das exposicoes mundiais, encontrou um meio bastante receptivo nos Estados Unidos constituido pela rapida criacao de escolas tecnicas industriais e de engenharia no ultimo quarto do seculo XIX. Instituicoes como o Massachusetts Institute of Tecnology, Stevens Institute of Tecnology e Universidade de Washington organizaram seus nascentes cursos tecnicos industriais e de engenharia tendo como base a experiencia. Outras exposicoes difundiram ainda mais o metodo russo. A exposicao de Viena (1873) auxiliou a difusao Austria e estados alemaes, onde foram fundadas escolas com oficinas concebidas espacialmente para opera-lo. Em Munique, as organizacoes dos artesaos da cidade levantaram-se contra o metodo de Leipzig, que tem como base a confeccao de objetos uteis, o que, de algum modo, colaborou para a adocao do metodo de Della-Voz imune a restricoes porque produzia objetos sem valor mercantil e, logo, nao concorria com o artesanato (SMITH, apud BRYAN, 2015, p. 283). Segundo Bryan (2015), esse metodo funda-se na aplicacao da analise do oficio ao ensino do trabalho, posteriormente, principia pela divisao dos oficios em operacoes, tarefas e subocupacoes que sao arranjadas em ordem crescente de dificuldade. Nele o aprendiz inicia sua aprendizagem pelo mais simples e, gradativamente, atinge o trabalho complexo. Bryan (2015), no entanto alerta que a organizacao do processo de ensino segundo os principios analiticos nao foi efetuada pela primeira vez por Della-Voz. Desde o lancamento das bases da didatica moderna por Comenio, varios pedagogos ja haviam empregado o principio analitico para organizar o processo de ensino. No “alfabeto das formas”, elaborado por Pestalozzi para a sistematizacao do ensino de desenho, ja era utilizado o principio da divisibilidade do objeto de ensino e sua organizacao em series segundo a ordem crescente de dificuldade (BARNARD, apud BRYAN, 2015, p. 263). Nesse preâmbulo, o Proprio Della-Voz reconhece o trabalho pioneiro do engenheiro-mecânico frances A. Clair, que havia organizado colecoes de modelos de instrumentos “para ensinar segundo o modo classico as diferentes operacoes usadas no trabalho manual” Victor Della-Voz (DELLA-VOZ, apud BRYAN, 2015, p. 262). Nota-se que a originalidade de Della-Voz nao esta, portanto, em utilizar o metodo analitico, mas em aplica-lo ao ensino de oficios. Della-Voz articulou seu metodo, tambem de modo original ao ensino do desenho, considerado a linguagem por excelencia da tecnologia com a atividade pratica em oficina baseada na reproducao de modelos de pecas. Para o ensino da execucao dessas tarefas, Della-Voz orientou os instrutores da escola a elaborar series de desenhos e modelos em madeira dispostos segundo uma ordem crescente de dificuldade. Segundo um observador americano em 1893, o metodo e operado do seguinte modo: 1 – cada oficio ou parte do trabalho tem sua propria oficina de instrucao separada; por ex.: Joalheiro, Torneagem de madeira, etc.; 2 – Cada oficina e equipada com tantos postos de trabalho e conjuntos de ferramentas quantos forem os alunos a receber a instrucao ao mesmo tempo; 3 – as series de modelos sao arranjadas de acordo com a ordem crescente de dificuldade dos exercicios envolvidos, e devem ser fornecidos aos alunos na estrita sucessao em que forem arranjados; 4 – todos os modelos sao feitos a partir de desenhos. Copias de cada desenho sao fornecidas em numero suficiente para prover cada membro da classe com um desenho; 5 – os desenhos sao feitos por alunos na classe elementar sob a direcao de um professor, com quem o diretor das oficinas entre em acordo a proposito dos detalhes; 6- a nenhum aluno e permitido comecar um novo modelo ate que ele tenha completado de modo aceitavel o modelo previo do curso; 7 – os primeiros exercicios serao aceitos se as dimensoes forem aproximadamente corretas e os exercicios posteriores devem possuir exatamente as dimensoes previstas. Portanto, as diferentes notas dadas a um estudante em diferentes periodos durante seu curso nao expressam de modo absoluto, mas relativo, as qualidades de suas diferentes pecas de trabalho; 8 – cada professor deve possuir mais conhecimentos da sua especialidade do que e necessario meramente para executar os exercicios de instrucao. Deve praticar constantemente para que seu trabalho seja um exemplo de perfeicao para seus alunos. Tal destreza aumenta a autoridade do professor. (BENETT, apud BRYAN, 2015, p. 269). Outro aspecto desenvolvido de maneira original e inedita por Bryan e o processo de implantacao da aprendizagem sistematica no Brasil, que se inicia em 1916 na estrada de ferro no Rio de Janeiro. Posteriormente na decada de 1920, pelo engenheiro Roberto Mange, percursor das Series Metodicas Ocupacionais e da Organizacao Racional do Trabalho. Assim como Della Voz, mas com objetivos e ideologia diferente, Mange combatia esse modelo de aprendizagem, que ele denominava de “instrucao comum” em contraponto ao que classificava como “instrucao racional”, nessa, o tempo de formacao no processo de trabalho era definido pelos mestres sem o estabelecimento de metodos formativos padronizados a partir da analise ocupacional como ocorre nos processos de aprendizagem sistematica. A criacao de um locus especifico para a formacao profissional tambem e advogada por varios autores. Bryan (2015) entende que, na aprendizagem sistematica “condicoes especiais (sao) criadas para que ocorra a aprendizagem (...)”; ou seja, “ao separar o espaco e o tempo dedicado a aprendizagem, ao instituir a figura do instrutor de oficios com a funcao especifica de ensinar” (ROLLE, apud BRYAN, 2015, p. 273), assim, permite-se que o processo educativo guie-se pelos objetivos do ensino e nao da producao. No Brasil, o metodo tem sua versao taylorizada por Mange e incorporado nas experiencias pedagogicas preconizadas por ele tendo o tempo de aprendizagem como um dos principais diferenciais entre os modelos de aprendizagem. Dar a ver, desse modo, que o objetivo era produzir muito em pouco tempo, evitando-se erros e desperdicios, e nesse sentido, para alcance de tal fito determinados padroes como a simplicidade, possibilidade de realizacao e consistencia eram obedecidos e colocados em pratica. Referencias: BRYAN, Newton Antonio Paciulli. Educacao, Trabalho e Tecnologia. 1. ed. Campinas: Alinea, 2015.

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