
O tombamento de Santa Ifigênia e Campos Elísios: reflexões sobre os caminhos cruzados do patrimônio e do urbanismo em São Paulo
2016; Volume: 9; Issue: 2 Linguagem: Português
ISSN
1982-9760
AutoresPedro Beresin Schleder Ferreira,
Tópico(s)Urban Development and Societal Issues
ResumoEm meados da decada de 1980, o entao prefeito de Sao Paulo, Jânio Quadros, como parte de seu “liberalismo urbano”, negligenciou o Plano Diretor entao vigente, aliviando suas normas condutoras em favor dos interesses do capital privado. Firmou-se como protagonista da transformacao urbana o “reloteamento”, ou nos dizeres atuais, a “revitalizacao” dos bairros Santa Ifigenia e Campos Elisios. E nesse contexto que surge o processo de tombamento dessas mesmas areas, em clara afronta aos planos da gestao municipal. Em 1986, foi realizado pelo CONDEPHAAT (Conselho de Defesa do Patrimonio Historico, Arqueologico, Artistico e Turistico) um estudo de preservacao de ambos os bairros. Assinado por Modesto Souza Barros Carvalhosa, entao presidente do orgao, junto aos inominados conselheiros e consultores convidados. O estudo, logo transformado em processo de tombamento, permaneceu em trâmite ate 2008, quando passou por uma revisao, ate ser outorgado em 2013. A longa duracao do processo evidencia que nessa acao de salvaguarda, aparentemente de ordem meramente tecnica, estavam envolvidas disputas mais amplas do que as valoracoes patrimoniais. Para alem da preservacao de bens “culturais”, o estudo de tombamento de Santa Ifigenia e Campos Elisios teve como objetivo primordial uma acao politica: impedir a remocao das populacoes menos abastadas e sua consequente relocacao nos extremos perifericos. Nesse caso, o âmbito do patrimonio apresenta-se como um campo de disputas, tensionando sua definicao como um campo isento, homogeneo e univoco. Seguindo o pensamento de Antonio Arantes, o patrimonio e observado entao como uma construcao social que, portanto, nunca esta desassociada de uma acao futura, tampouco de interesses que transcendem a sua esfera particular: economicos, politicos etc. A presente pesquisa tem como objetivo compreender as tensoes existentes nesse processo entre os objetivos democraticos da preservacao e a utilizacao de um instrumento peculiar a sua acao, o tombamento, que possuia, dentro dos orgaos patrimoniais, uma tradicao de operacao distinta, por vezes distante das finalidades desejadas. Para tanto, analisou-se os criterios de selecao utilizados no estudo de 1986, o discurso patrimonial que endossou o tombamento desses bairros, finalizando-se com um balanco de seus resultados efetivos. Observou-se que, apesar do cerceamento da propriedade e “congelamento” da area, impedindo o “arrasamento” dos bairros, a selecao dos bens e a proposta de preservacao realizada culminaram em uma exclusao simbolica do que se pretendia defender. Assim, procurou-se apreender as implicacoes da utilizacao do tombamento nesse caso e subsidiar discussoes acerca das potencialidades e limitacoes da utilizacao da acao patrimonial como instrumento de urbanismo.
Referência(s)