Artigo Acesso aberto Produção Nacional

REPRESENTAÇÕES DO FIGURAL FEMININO: ANTÔNIO VIEIRA E A DOUTRINA DOS ARQUÉTIPOS - PANDORA, EVA E AVE MARIA

2018; Issue: 18 Linguagem: Português

10.11606/issn.2175-3180.v9i18p20-29

ISSN

2175-3180

Autores

Felipe Lima da Silva,

Tópico(s)

Food, Nutrition, and Cultural Practices

Resumo

É evidente a retomada das referências à mulher em grande parte das manifestações artísticas ao longo da história da cultura e das religiões. A (sobre)vivência da figura do feminino, por sua vez, condicionou-se a formas diversas de representação – da matriz greco-romana à era do Catolicismo ortodoxo ou, em outros termos, da figura de Pandora à de Eva, plasmando, no intervalo dos tempos, como forma digna de imitação dos costumes, a imagem da Virgem Maria. Aqui, proponho pinçar um momento particularmente interessante na historiografia literária luso-brasileira, examinando um sermão de Antônio Vieira, orador sacro dos mais admirados no século XVII, dirigido inteiramente às mulheres, para ilustrar as encenações do feminino sob o prisma do Cristianismo. Especificamente, analisarei um sermão pregado, em 1651, para as religiosas do Patriarca São Bernardo, no Convento de Odivelas, em Portugal, cuja unidade de sentido, operada sob a lógica pragmática, é estabelecer uma crítica aos hábitos das freiras que passavam horas do dia em frente ao espelho, objeto este que, para o sermonista em foco, é uma metonímia do “demônio mudo”, que seria muito mais astucioso que qualquer outro demônio, até mesmo do que a serpente que persuadiu Eva no Paraíso. Partindo desse pressuposto, podemos entrever deslocamentos e reciclagens da simbologia conceitual da hýbris como desmedida, uma vez que Vieira continuamente estabelece relações com o mundo do paganismo, demonstrando que as ações das esposas do Céu – as freiras – são execráveis, pois são frutos de duas correntes censuráveis: por um lado, essas ações são herança de Eva pecadora e, ao mesmo tempo, são dignas de repúdio, pois vão ao encontro de uma prática antissocrática carregada de exageros e imoralizações. No fio condutor de nossa leitura, a hýbris é simbolizada nas dobras da vanitas – vaidades e futilidades – refletidas no espelho, significando um desacordo entre a vida no claustro e os costumes padrões de uma freira, que ultrapassa os limites do comportamento quando se empenha na ornamentação do invólucro carnal, esquecendo-se de embelezar a face da alma.

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