Artigo Acesso aberto Produção Nacional Revisado por pares

Vigilância da influenza: avanços e desafios para o Brasil

2018; UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS; Volume: 20; Linguagem: Português

10.5216/ree.v20.53937

ISSN

1518-1944

Autores

Divânia Dias da Silva França, Karlla Antonieta Amorim Caetano, Grécia Carolina Pessoni, Leandro Nascimento da Silva, Sheila De Arruda Santos Araújo, Adriana Magalhães da Silva, Laura Branquinho do Nascimento, Flúvia Pereira Amorim da Silva,

Tópico(s)

Zoonotic diseases and public health

Resumo

A infecção pelo vírus influenza causa uma doença viral aguda do trato respiratório, com distribuição global, tendência à sazonalidade e maior expressão nos períodos de outono e inverno(1). Os vírus influenza pertencem à família Orthomyxoviridae, possuem genoma de RNA segmentado e basicamente quatro tipos virais catalogados, sendo eles: A, B, C e D. Os vírus influenza A e B possuem potencial epidêmico, sendo que o tipo A possui expressão pandêmica. O vírus tipo C é menos frequente e relacionado a infecções leves, portanto, sem grandes impactos na saúde pública. Já o vírus influenza D é exclusivamente zoonótico(2).A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima uma carga global de aproximadamente 3 a 5 milhões de casos graves por ano, destes, cerca de 290.000 a 650.000 pessoas morrem em decorrência de complicações respiratórias. Adicionalmente, as epidemias podem resultar em altos níveis de absenteísmo no trabalho/escola, perdas de produtividade e elevada sobrecarga dos serviços e trabalhadores de saúde(1).No Brasil, a vigilância epidemiológica da influenza iniciou em 2000 com o monitoramento dos casos de síndrome gripal em unidades de saúde sentinela(3). Em 2004, após a ameaça da gripe aviária altamente patogênica, o país aderiu a uma estratégia internacional proposta pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) com o objetivo de promover o fortalecimento da rede de diagnóstico laboratorial para detectar o vírus influenza com potencial emergente e sazonal(4).Estas iniciativas não foram capazes de minimizar os impactos deletérios da pandemia pelo vírus influenza A (H1N1)pdm09, que só em 2009, acometeu 50.482 pessoas em todo o país e provocou 2.060 óbitos(5). Entretanto, a presente situação funcionou como um grande laboratório para avaliar e aprimorar a rede nacional de vigilância e assistência relacionada a esse agravo. O monitoramento atual, além de identificar os vírus respiratórios circulantes no Brasil, colabora na adequação da vacina de influenza sazonal para o Hemisfério Sul, garantindo a representatividade mínima da circulação viral em todas as unidades federadas do país(6).Dados do Ministério da Saúde do Brasil, entre 2012 e 2017, mostram uma redução no número de casos por influenza quando comparados com a pandemia ocorrida em 2009. Neste período, 27.674 indivíduos foram identificados com o vírus influenza e 4.605 óbitos foram associados à infecção. Por outro lado, de janeiro a junho de 2018 (semana epidemiológica 25), 3.558 casos foram confirmados por influenza no país. Goiás concentrou cerca de 10,4% e 63,0% do total de casos registrados no Brasil e região Centro-Oeste, respectivamente, apresentando uma taxa de letalidade 18,0%(7).Epidemiologicamente, sabe-se que as principais medidas de prevenção e controle da doença incluem a vacinação anual contra influenza, adoção das medidas de precaução padrão e para gotículas e introdução precoce de terapia medicamentosa para indivíduos com síndrome gripal, classificados como grupos de risco(8).Invariavelmente, a vacinação mostra-se como uma das medidas mais efetivas para a prevenção de casos graves e a diminuição da letalidade(9). Em contrapartida, a discussão sobre o período de disponibilização para o Hemisfério Sul da vacina é controverso. Pesquisadores (10-11) destacam como adequado o início da vacinação em abril, prevendo que o maior risco de infecção por influenza na América do Sul, concentra-se entre os meses de abril a setembro. Entretanto, não há padrão sazonal para a ocorrência de influenza e outras doenças respiratórias no país. Há evidências de que na região Nordeste a imunização contra influenza tem sido realizada após o período de maior circulação do vírus(12).De fato, ao se observar os últimos anos desta infecção no Brasil (2009-2018), verifica-se que entre os meses de janeiro à março não há distribuição uniforme do agravo em todas as regiões do Brasil, apesar de a vacina contra influenza ter sido distribuída rotineiramente entre abril e maio em todo país. Em 2017, nas Regiões Nordeste e Norte o número de casos notificados antes da campanha nacional de vacinação contra influenza foi maior em comparação aos meses subsequentes. Além disso, na Região Centro-Oeste o pico de casos identificados também antecedeu a campanha nacional(7).A partir deste cenário, questiona-se quais medidas poderiam ser tomadas por parte da vigilância em saúde no Brasil que fossem capazes de minimizar a morbimortalidade por esta síndrome. Resultados de uma pesquisa(13) apontam como uma estratégia viável para o Brasil a implementação da vacinação pelo menos três meses antes do que é recomendado atualmente. Outra opção, seria a implementação de um cronograma diferenciado que antecipasse a vacinação para algumas regiões, considerando a situação epidemiológica local. No entanto, a antecipação da vacina envolve um grande desafio logístico para laboratórios internacionais e nacionais. Assim, deve-se investigar e estimular a viabilidade da introdução antecipada da vacina no Brasil.Um outro fator que deve ser levado em consideração durante os períodos de maior expressão deste agravo é o modo indiscriminado da veiculação de informação por parte da mídia e redes sociais, que em proporções distorcidas, nem sempre refletem a situação epidemiológica real. Tais mecanismos levam a uma grande repercussão no comportamento da população em geral e profissionais de saúde, causando uma alta demanda pela vacina e, por vezes, a comercialização na rede privada com valores exorbitantes e com qualidade técnica questionável. Isso ocorre em razão de que as condutas para acondicionamento, transporte e administração da vacina nem sempre seguem as especificações preconizadas por órgãos oficiais. Essa situação pode reduzir a eficácia do imunobiológico, além de causar eventos adversos relacionados à vacinação.Os fatos apresentados não deixam dúvidas que outras epidemias sazonais associadas ao vírus influenza poderão atingir o Brasil em um futuro próximo. Esforços nacionais para a redução da letalidade deste agravo devem ser prioridade para a saúde pública. A mobilização dos pesquisadores, diante das lacunas de conhecimento, seja a respeito da disponibilização da vacina contra influenza, como também da consequência da informação/comunicação sem responsabilidade em momentos de crises, é determinante para o enfrentamento da influenza no Brasil. REFERÊNCIAS1. World Health Organization. Influenza (Seasonal) [Internet]. Genebra (SU): World Health Organization; 31 jan. 2018 [acesso em: 20 jul. 2018]. Disponível em: http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs211/en/.2. International Committee on Taxonomy of Viruses. Taxonomy [Internet]. 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Ministério da Saúde. Guia para a Rede Laboratorial de Vigilância de Influenza no Brasil [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde, 2016 [acesso em: 20 jul. 2018]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_laboratorial_influenza_vigilancia_influenza_brasil.pdf.7. Ministério da Saúde. Influenza/Gripe. Situação Epidemiológica / Dados [Internet]. Brasília (BR): Ministério da Saúde; c2013-2018 [acesso em: 20 jul. 2018]. Disponível em: http://portalms.saude.gov.br/saude-de-a-z/gripe/situacao-epidemiologica-dados.8. Srivastav A, Santibanez TA, Lu PJ, Stringer MC, Dever JA, Bostwick M, et al. Preventive behaviors adults report using to avoid catching or spreading influenza, United States, 2015-16 influenza season. PLoS One [Internet]. 2018 [acesso em: 20 jul. 2018];13(3):e0195085. Diponível em: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0195085.9. Demicheli V, Jefferson T, Di Pietrantonj C, Ferroni E, Thorning S, Thomas RE, et al. 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Referência(s)