
MÚSICA ANTES, PALAVRA DEPOIS
2018; Programa de Pós-graduação em Música (USP); Volume: 18; Issue: especial Linguagem: Português
10.11606/rm.v18iespecial.151088
ISSN2238-7625
Autores Tópico(s)Pentecostalism and Christianity Studies
ResumoO processo de catequização das crianças indígenas nas missões jesuítas brasileiras foi bastante peculiar, certamente diferenciado do que ocorria nos colégios europeus. Os padres inacianos precisaram aprender a língua local, adaptar os pro-cessos e materiais pedagógicos e proporcionar aos curumins uma vivência religiosa da qual eles nada conheciam. O uso da música foi essencial para estabelecer uma conexão mais próxima, atrativa aos índios, servindo ao mesmo tempo de isca para a catequese e de reforço ao aprendizado da doutrina. Embora essencialmente vocal, boa parte do repertório musical da catequese foi realizado em instrumentos, particularmente em flautas, amplamente empregadas pelos missionários, so-bretudo nas primeiras décadas de sua atuação (1550-1610). Nesta comunicação, pretendemos demonstrar que o ensino de instrumentos musicais às crianças indígenas, particular-mente de flautas, não visava apenas proporcionar uma varia-ção instrumental ao repertório, mas também estabelecer um elemento uniformizador de resposta à doutrina. A barreira da língua e a compreensão real do conteúdo cristão eram algu-mas das maiores dificuldades enfrentadas pelos padres, mas a realização da música pelas flautas de certa forma minimizava tais obstáculos e proporcionava a sensação de êxito na ativi-dade missionária. Se a palavra é necessária para concretizar e explicitar o pensamento, enquanto a música potencializa seu significado, nas missões jesuítas brasileiras os papéis parecem ter se invertido: a música serviu antes como recurso de assimi-lação, e a palavra, em língua desconhecida, constituidora de um texto complexo, foi por muitas vezes elemento acessório e não totalmente assimilado.
Referência(s)