A Desigualdade em Perspectiva Socioespacial: Notas e Reflexões em Torno de uma Realidade Compressiva e Conflitual
2016; Linguagem: Português
10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/ciencias-sociais/realidade-compressiva-e-conflitual
ISSN2448-0959
Autores Tópico(s)Urban Development and Societal Issues
ResumoO artigo se devota a uma análise da desigualdade em suas implicações socioespaciais, procurando mostrar a recorrência desse tema na história, procurando apontar as distinções entre diferenciação e desigualdade, não raro tomadas como expressões sinônimas pelo senso comum. A análise enfatiza o avanço e o próprio redimensionamento da desigualdade na esteira do capitalismo e de formação do mundo-moderno, pondo em relevo o sentido correlato adquirido pela desigualdade, que se consubstancia em sua inter-relação com o espaço, metabolizando-se, assim, como desigualdade socioespacial, estreitamente associada ao movimento contraditório e desigual do capitalismo, que alcança maturidade com a consolidação da urbanização da sociedade. Tal urbanização, tornada extensiva e geograficamente dispersa e difusa sob os influxos do capitalismo monopolista, passa a representar a própria espacialização societária contemporânea. Vale ressaltar que essa urbanização extensiva, consolidada pela industrialização fordista até fins dos anos 1960 e início dos 70, se atualiza, ao mesmo tempo em que se complexifica no contexto de crise/esgotamento do padrão de acumulação fordista e do desenvolvimento de um novo padrão de acumulação, de traço flexível-espoliativo, desempenhando um papel central a profusão de novas tecnologias de informação e comunicação, bem como uma espetacular financeirização da economia, num quadro de profusa expansão territorial da terceirização, que matizam o estágio atual da globalização capitalista, conducente a uma urbanização mais espraiada, com a multiplicação e expansão de cidades médias, entabulando uma nova urbanização de feição metropolitana, que aproxima geograficamente as desigualdades, a pobreza e a riqueza, sob o sentido de uma oposição conflituosa e degradante. A análise destaca a inserção e o papel da periferia no processo de formação do sistema-mundo, revelando-se não como um estágio, momento ou circunstância do desenvolvimento histórico do capitalismo, mas fundamentalmente como um espaço integrado a ele, ou ainda como uma função ou condição imprescindível à estrutura de seu próprio funcionamento e sustentação. Tal abordagem nos leva a situar o sistema-mundo capitalista como uma totalidade socioespacial intrinsecamente contraditória e desigual, no qual a reprodução e expansividade da periferia, ou talvez, de periferias, assinalam uma característica estrutural da espacialidade capitalista. Na periferia, sob o movimento de contradições mais recrudescidas, em que pesem os influxos de mudanças estruturais nas formas de organização do trabalho, ao lado de reestruturações vultosas no espaço, principalmente em grandes espaços urbanos, embasadas na associação entre o capital financeiro e o imobiliário, que contam com a coordenação do Estado, ao que se soma a proeminência da lógica rodoviarista e seus impactos no território, temos, assim, o avanço, a passos rápidos, de um conjunto de situações urbanístico-sociais problemáticas em nossas cidades, em aspectos diversos, que apontam, sob um sentido social, para o agravamento de uma urbanização crítica, que acirra desigualdades, privações e expropriações. Do ponto de vista do capital, premido por condições de desvalorização do ciclo depressivo atual do capitalismo, estas operações se mostram como novas frentes de valorização do capital, impondo um descompasso entre a escala do valor econômico (valor de troca) e a do valor de uso (relacionado a aspectos qualitativos) no/do espaço. Sob esta condição, temos emergências de novas formas de resistência, lutas e organização social, influindo modalidades político-espaciais que encetam, ao plano da vida cotidiana, uma diversidade de ações de caráter propositivo nos interstícios da urbe, tanto em espaços centrais como periféricos, tratam-se de práticas que se mostram dotadas, em boa parte, de certo traço auto-organizacional ou mesmo autogestionário. Considerando-se que não necessariamente negam o Estado, estas práticas são compreendidas como vetores capazes de potencializar a democracia e transformações socioespaciais mais desejadas pela sociedade, sinalizando um contraponto auspicioso ao problema da desigualdade na contemporaneidade, se não delineando uma via alternativa num contexto marcadamente estatista e privado-corporativo.
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