Artigo Produção Nacional Revisado por pares

From Revolution to Power in Brazil: How Radical Leftists Embraced Capitalism and Struggled with Leadership

2020; Duke University Press; Volume: 100; Issue: 4 Linguagem: Português

10.1215/00182168-8647409

ISSN

1527-1900

Autores

Daniel Aarão Reis,

Tópico(s)

Social and Political Issues

Resumo

Kenneth P. Serbin estuda a trajetória de revolucionários brasileiros, da luta armada contra a ditadura (entre 1964 e 1974) à adesão às ideias e práticas do regime democrático (entre 1974 e os dias atuais).Na parte 1 (capítulos de 1 a 4), narra-se a saga revolucionária que se estendeu até 1974. Derrotada a luta armada, inicia-se o processo de integração dos militantes revolucionários à resistência não violenta à ditadura (parte 1, capítulo 5). Nas prisões, no exílio ou no país, os revolucionários participarão das lutas democráticas, dos movimentos sociais e das disputas eleitorais, processo que se estende durante as décadas de 1980 e 1990 (parte 2, capítulos de 6 a 9). Na parte 3 (capítulos de 10 a 13), narra-se a história de como alguns desses revolucionários assumiram o poder, exercendo-o como lideranças ou auxiliares, dos anos 1980 à eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002. Os dois últimos capítulos, que também integram a parte 3, analisam os acontecimentos recentes (governos Dilma Rousseff, entre 2010 e 2016; o impeachment desta última, em 2016; o governo Michel Temer, entre 2016 e 2018; e a eleição de Jair Bolsonaro, em 2018).No prólogo do livro, o autor expõe objetivos e métodos de trabalho. Suas fontes básicas são depoimentos de nove ex-militantes de uma das principais organizações de luta armada contra a ditadura: a Ação Libertadora Nacional (ALN). Ao longo do texto, dialoga-se com extensa bibliografia especializada, brasileira e estrangeira. Há ainda 45 ilustrações (de modo geral, fotografias dos entrevistados) e um índice remissivo.O texto constitui relevante contribuição à história política do Brasil e, em especial, à compreensão das esquerdas brasileiras nos últimos 50 anos. O estudo das metamorfoses sofridas pelos militantes da luta armada, que se transformam em partidários da democracia e da gestão democrática do poder, preenche uma importante lacuna. Esperemos que abra caminho para novas pesquisas com esse mesmo escopo.Entretanto, alguns aspectos merecem ressalvas.Serbin não explica por que escolheu exatamente a ALN ou os militantes, cujos depoimentos são apresentados como esclarecedores. Dos nove entrevistados, apenas dois acumularam experiência importante de ações armadas (Manoel e Carlos Eugênio). Quanto ao exercício do poder, também apenas dois (Marcio e Aloysio) ocuparam cargos de relevância. Nesse sentido, o título presta-se a equívocos. O interessante nos depoimentos seria compreender como e se os militantes ouvidos superaram realmente a perspectiva autoritária (luta armada) em proveito de concepções democráticas. Debates a respeito poderiam ter sido aprofundados, pois esse aspecto é o coração do trabalho. Em outras palavras: os valores democráticos teriam sido efetivamente incorporados como valores universais ou permaneceram apenas como “instrumentais” na boa tradição das esquerdas brasileiras? Essa questão central foi abordada, mas não ganhou o devido aprofundamento.O autor não esconde sua simpatia pelos entrevistados. Daí não necessariamente decorreriam erros de avaliação. Contudo, as opiniões formuladas a respeito deles são, no mínimo, ambíguas: quase sempre são caracterizados como “idealistas”; em certo momento, a luta armada é aparentada com a ação do pastor Dietrich Bonhoeffer, que conspirou contra Hitler, uma comparação deveras inusitada, mesmo porque várias das ações revolucionárias são caracterizadas como “terrorismo”, uma questão que é discutida muito superficialmente (p. 13 e 329). Todavia, não teria sido importante cotejar os depoimentos registrados com os de outros militantes e também com documentos históricos de diferentes tipos (arquivos da repressão, imprensa etc.)?Uma opção editorial resolveu conduzir a narrativa até os dias atuais, o que não era essencial ao propósito do livro e provocou um certo desequilíbrio. Os últimos períodos, a partir da posse de Dilma Rousseff em 2010, foram apresentados e analisados de modo apressado. Mal se discutem as condições e as causas da vitória de Jair Bolsonaro, o que é fundamental para compreender o Brasil atual, mas não para compreender a trajetória dos militantes da luta armada à democracia. Não teria sido prudente terminar o livro nos anos Lula (2002-2010)?Por abranger um período de meio século, o texto apresenta pequenos erros de fato e de apreciação. Entre outros: o Partido Comunista Brasileiro (PCB) não mudou de nome em 1958, mas em 1961 (p. 10); em 1947, não foi o governo que proscreveu o PCB, mas o Tribunal Superior Eleitoral (p. 10); Prestes e o PCB não apoiaram Getúlio Vargas entre 1950 e 1954, ao contrário, moveram oposição radical a ele, até o seu suicídio (p. 11); o sistema corporativo sindical, instaurado nos anos 1940, não permanece “até hoje”, mas foi modificado pela Constituição de 1988 e, mais recentemente, pela reforma trabalhista empreendida pelo governo Temer (p. 208); Paulo de Tarso Venceslau não foi expulso do Partido dos Trabalhadores (PT) “supostamente” (reportedly) por insistência de Lula; a exigência de Lula por sua exclusão foi pública e notória (p. 242).Nenhum desses reparos questiona a relevância e a oportunidade do livro de Kenneth P. Serbin que abre um campo original e fecundo de estudos sobre as esquerdas brasileiras.

Referência(s)