Artigo Revisado por pares

Pintura de História e Razão de Estado: Um Estudo Sobre a Fundação da Nação Brasileira

2006; Modern Humanities Research Association; Volume: 22; Issue: 1 Linguagem: Português

10.1353/port.2006.0017

ISSN

2222-4270

Autores

Maria Eliza Linhares Borges,

Tópico(s)

Cultural, Media, and Literary Studies

Resumo

Pintura de Historia e Razäo de Estado: UmEstudoSobrea Fundaçaoda Naçao Brasileira MARIA ELIZA LINHARES BORGES 4 Os olhosnäo vêemcoisasmasfiguras de coisasque significarli outrascoisas:o torquesindicaa casa do tira-dentes; o jarro,a taberna; as alabardas, o corpode guarda[...]. A coisaé reconhecidapelos ímbolo de algumaoutracoisa.' Italo Calvino Os olhospercorrem as páginasde doistomose trèsvolumesde umlivro intituladoViagem pitoresca e histórica ao BrasilAs imagensbrotadasda pena seguem-se outras, saídasdo movimento de pincéis,luzese sombras. Aindaque por descuidoo leitorem questáo näo tivesse atentadopara o títulodo livroe o nome de seu autor,muitoprovavelmente algumas imagensgravadasno espaço teriamevocado o nome de Jean Baptiste Debret.Afinal, quem dentreos brasileiros escolarizados näo se deparou pelomenosurnavezcomreproduçoes destepintor de historia cujosolhos pousaramminuciosamente sobreo cotidianodas esquinas,ruase nielas do Rio deJaneiroimperial, capitaldo ReinoUnidode Portugal, Brasile Algarves? Na realidade,o nomede Debretsimbolizamaisdo que isso.Lembranos a conturbada historia da fundaçaoda AcademiaReal de BelasArtes do Rio de Janeiro,que o historiador Afonsode E. Taunaytäo bem registrou. Seu nomenos transporta tambéma urntempoem que o Rio deJaneiroe o restante do Brasiltestemunharam um intensoire virde viajantes estrangeiros interessados, pormúltiplas e diferentes razöes,em conhecera natureza e a sociedadedestaterra aindaincognita paragrande partedos europeus.Da curiosidade,metodicaou näo, dos viajantes, e dentreeles está Debret,nasceu toda urnaliteratura de viagemonde a flora,a vidados diferentes segmentos sociais,a arquitetura, as festas, o trabalho, a produçao,a vidana corte, dentreoutrosaspectos, tornaram-se objetode interesse dos estrangeiros. Do pontode vistaartístico, o nome de Debret,que os estudiososde pinturasao unánimesem reconhecer como 'pintor duro,desenhista de mérito, preocupadocoma verdadee o efeito',1 também evocaa trajetória assimétrica entreo neoclassicismo e o romantismo no Brasil. 1 Françoise Benoit, apud Mario Barata, 'SéculoXIX.Transiçâo e inicio doséculoXX',inWalter Zanini(org.),Historia Gerat daArte noBrasil (Säo Paulo:Instituto Walther Moreira Salles,1983), p. 1388. 4O MARIA ELIZA LINHARES BORGES Poressase outrasrazöesas imagensvisuaisde Debrettêmsidoobjeto de interesse de estudiosos das maisdiferentes áreasdas cienciassociaise das artesno Brasil.Diversos sao os olharese as perguntas dirigidas à sua farta produçaoiconográfica sobrea vidanacorteimperial e ñasprovincias do sulao longodos quinzeanos em que se radicouno país. A nos interessa trabalhar com o Debretde Viagem pitoresca e histórica ao BrasilNessaobra-monumento, concebidaem dois tempos(1816/31 e 1834/39) e em dois lugaresdistintos(o Brasile a Franca), Debret quercelebrara memoriado Instituto de Francae dos patrocinadores da AcademiaRealde BelasArtesdo RiodeJaneiro, bemcomoregistrar sua participaçâonesseprojetocivilizatório. Por issomesmoele nos diz que buscou'colherdados exatose de primeira ordern a firn de servir a urna arteconsagradaa salvar a verdadedo esquecimento'2 (grifo nosso). Paraconcretizar seusobjetivos, o pintorde historia constrói urnatese sobre a fundacäoda Naçâo Brasileira, a quai seriafrutoda vinda da familiareal portuguesapara sua colonia na América.Para sustentar o argumento de que 'foiumreiportugués que acordouo brasileiro depois de trèsséculosde apatia',3Debretmesclaobservaçâodireta, informaçoes de terceiros e memoria, jogando o tempotodo com textoe imagem. Como se veráao longo desteartigo, a idéia de fundaçâoda nacáo será trabalhadaa partirda articulaçâoentreos pares infância/maturidade; apatia/vitalidade e atraso/civilizaçao. Debret:umpintor cortesáo? Sabe-seque a narrativa é urnadas principáiscaracterísticas das obras conceituadascomo pinturade historia.4 Acoplada ou nâo a um texto, suas imagensfuncionamcomo mensagensque comunicamintençôes; cumpremfunçoes5ligadas aos interessesde seus patrocinadores. As historias narradaspor esse tipode imagematendemfundamentalmente a intéresses e necessidadesdo universo do poder. O aprendizadode um profissionai da pinturade historia- oficio nascido a partirda chamada pinturade corteou pinturade género, ampiamente difundido na Francade LuisXIVe na EspanhadosAustrias - eratodoestruturado a partir de umfirn previamente definido: a gloria 2Trabalharemos coma ediçâobrasileira deJ.B. Debret,Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, traducáo e notas de Sergio Milliet, noticia bibliográfica deRubens BorbadeMoraes(Sao Paulo: Martins/ Ed.da Universidade de Sâo Paulo,1072). 3 Debret,Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, p. 354 (grifonosso). 4 Paraumconceito de pintura de historia e sobretudo sobresuarelaçâocoma idéiade naçâo e nacionalismo, verTomásPVejo,'La pintura de historia yla invención de lasnaciones', Locus: revista dehistoria 8 (íqqq), pp. 156-57. 5 'Sobreo problema da...

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