
Apresentação
2022; UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA; Volume: 17; Issue: 47 Out. Linguagem: Português
10.14393/rct174701
ISSN1809-6271
AutoresEstevan Leopoldo de Freitas Coca, Gabriela Abrahão Masson, Janaína Francisca de Souza Campos Vinha, José Sobreiro Filho,
Tópico(s)Agriculture, Land Use, Rural Development
ResumoO caráter devastador da necropolítica (MBEMBE, 2016) adotada pelo governo de Jair Messias Bolsonaro, do Partido Liberal (PL), vem minando a (re) existência da classe trabalhadora e atinge as mais distintas esferas socioespaciais. Nos campos, nas águas e nas florestas, diversas são as formas de violência e inúmeros são os ataques às comunidades camponesas, indígenas, quilombolas e outros povos tradicionais, evidenciando um conjunto orquestrado, deliberado e impositivo de mudanças cruéis e regimentadas por uma agenda ultraneoliberal, revigorada no Brasil com o golpe contra ex-presidenta Dilma Rousseff em 2016. Diversos foram os retrocessos no âmbito da institucionalidade das políticas públicas voltadas ao campo para a agricultura camponesa e para os territórios de reforma agrária e quilombolas. Os direitos sociais dos (as) trabalhadores (as) rurais, que além de serem conquistas pontuais e tardias, estão cada vez mais ameaçados, sendo a fome e a pobreza uma realidade latente e reveladora da atual configuração da questão agrária brasileira. Não temos dúvida de que também no Brasil existe um governo populista e de extrema direita com fortes raízes agrárias (SCOONES et al., 2022), haja vista os incontestes apoios que recebe de grande parcela do agronegócio, dos grileiros, dos garimpeiros, das mineradoras e dos madeireiros. Faz parte de seus objetivos não apenas a invisibilização de modos de produção e vida que se contraponham ao agronegócio, como também o seu desaparecimento. Ou seja, se em contextos de exacerbação do neoliberalismo, a invisibilidade da produção familiar foi um duro golpe naqueles (as) que anseiam por um campo mais justo e saudável, na atualidade, o que vivemos/temos, é muito pior. Instado por um anseio de eliminação daqueles (as) que pensam e agem diferente do que é previsto e propagado por sua base, o atual governo brasileiro atua em favor da anulação física e simbólica de camponeses e dos povos originários e tradicionais, ribeirinhos (as), quilombolas, extrativistas etc. A ascensão da hegemonia política dessa direita populista, autoritária e fascista no Brasil, desde então, faz com que o processo de luta pela terra seja cada vez mais árduo, travejado por disputas e conflitos, necessitando a reinvenção e a renovação de instrumentos e estratégias contra-hegemônicas. Potencializada pela pandemia de Covid-19, iniciada em Março de 2020, a redução de direitos, renda, emprego e liberdade colocadas à essas populações tornam-nas ainda mais vulneráveis, intensificando os atos de desrespeito e violência contra os (as) trabalhadores (as) do campo, em assentamentos rurais, acampamentos, quilombos, junto às mulheres, à população LGBTQIA+ e aos territórios indígenas e tradicionais em todo o país. Esse cenário é marcado por um profundo desinteresse na vida dos camponeses (as), quilombolas, indígenas, ribeirinhos etc., especialmente colocando no horizonte a possibilidade de eliminação física dos adversários. Aos poucos, a estética da narrativa construída levou os sujeitos organizados, insubordinados e resistentes à razão neoliberal a se tornarem muito mais do que simples adversários políticos, transformando homens e mulheres em inimigos do desenvolvimento nacional. Mesmo nesse cenário de crescente medo e tensão, as ações desses sujeitos têm auxiliado a garantia de direitos básicos a diversos grupos, especialmente no combate à fome, através, por exemplo, da promoção do acesso a alimentos agroecológicos. Isso situa que apesar do agronegócio dinamizar a definição do alimento-mercadoria, a solidariedade de movimentos camponeses pontua por um outro caminho, o do alimento-bem comum. Mas essa realidade ainda é reveladora de outro fato curioso acerca dos movimentos camponeses, indígenas, quilombolas, ribeirinhos etc. no Brasil. Mesmo diante da necessidade do isolamento social durante a pandemia de Covid-19, os movimentos populares da esquerda não conseguiram cumprir o isolamento porque tiveram que seguir e ampliar suas lutas devido ao crescimento da pauta da saúde, mas também assumiram a responsabilidade por, através de ações solidárias classistas, alimentar a classe trabalhadora Diante dessa problemática, a proposta deste Dossiê é apresentar aos leitores estudos comprometidos e críticos que sejam capazes de estimular diálogos, pensamentos, conhecimentos, concepções, práticas e experiências multidisciplinares de ordem contestadora e emancipatória, com ênfase em análises investigativas que provoquem a reflexão sobre a questão agrária no país, sobretudo no que diz respeito ao processo de lutas, enfrentamentos e resistências pela/na terra no contexto de Covid-19 desde 2020.
Referência(s)