Imagética feminina e amor de ouvido no Cancioneiro Geral: o caso de Sá de Miranda
2025; University of Alicante; Issue: 14 Linguagem: Português
10.14198/rcim.27447
ISSN2254-7444
Autores Tópico(s)Medieval Iberian Studies
ResumoEmbora não tenha sido até agora objeto de atenção e a sua presença seja mesmo excecional, o chamado amor de ouvido (de oídas, na tradição crítica castelhana) aparece no Cancioneiro Geral, tal como acontece nos cancioneiros manuscritos galego-portugueses, em que certos trovadores (por exemplo, Pero Viviaez), dirigem as suas declarações sentimentais a senhoras não vistas, mas das quais ouviram falar. Sob uma perspetiva histórica, comparatista e intertextual, analisamos a procedência e a projeção do topos nos versos de Sá de Miranda recolhidos por Garcia de Resende. Na verdade, na coletânea lusa, onde também sobressai uma composição de Gregório Afonso à fama como causa de idealização da dama (ainda) não contemplada com os olhos, este adquire uma especial importância sobretudo por dois motivos. Um deles é a sua ligação com outro núcleo temático à volta do qual gira toda a produção do poeta do Neiva: o desdobramento da personalidade que amiúde provoca a dama ingrata e traidora, causando grande aflição no sujeito lírico e tornando-o mesmo inimigo de si próprio, sobretudo nos trilhos de Jorge Manrique. O outro é a sua inserção em duas esparsas em que, de modo análogo às cantigas de amor trovadorescas, se sublinha a falta de correspondência entre o ouvir que causou a paixão e o ver, mas num Quadro imagético novo, o qual será retomado e amplificado com mais elementos plenamente renascentistas noutra composição mirandina alheia ao Cancioneiro Geral. Nele destacam-se alusões tanto a traços congénitos da fisiologia humana (a surdo-mudez), quanto a figuras que remetem para o bestiário e a Bíblia (a sereia e a serpente), sobre cujos valores semânticos e simbólicos refletimos à luz do universo mítico, social e literário da época.
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