DESVENDANDO A IDENTIDADE DO POSSEIRO DA FRONTEIRA AMAZÔNICA
2001; EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA; Volume: 18; Issue: 3 Linguagem: Português
10.35977/0104-1096.cct2001.v18.8857
ISSN1678-3964
Autores Tópico(s)Rural and Ethnic Education
ResumoGUERRA, G. A. D. O Posseiro da Fronteira: Campesinato e Sindicalismo no Sudeste Paraense. Belem: UFPA / NAEA, 2001, 169 p. Embora reconhecidamente complexa, muito se tem escrito sobre a problematica do campesinato brasileiro. Como deve ser ambiente onde opera a geracao de conhecimento, predominam contradicoes, divergencias, controversias e diferencas. A unidade e desejada na luta dos contrarios e nesta perspectiva professor e pesquisador do Nucleo de Altos Estudos Amazonicos da UFPA - Universidade Federal do Para e da Universidade da Amazonica - Unama, Gutemberg Guerra, com a autoridade que lhe e propria como intelectual e conhecedor das questoes relacionadas com os camponeses e pobres do campo, traz ao debate conceitos ate certo ponto ineditos sobre os posseiros da fronteira amazonica brasileira. O autor tem a sua vida material marcada pelas contradicoes do capitalismo em face das suas experiencias como extensionista rural na cruel realidade do Nordeste brasileiro e como militante politico. Ele adiciona neste livro um conjunto de observacoes acerca dos posseiros do sudoeste paraense, na busca da unidade dentro de uma complexa totalidade, visto que as realidades dos camponeses nordestinos e nortistas ambas sao proprias do modo de producao capitalista. As relacoes sociais de producao independem da geografia fisica no qual estao historicamente estabelecidas a forma de produzir e apropriar-se das riquezas. A articulacao das forcas produtivas com as relacoes sociais de producao fazem construir nao apenas os espacos agricolas e nao-agricolas, mas tambem os sociais. O professor Gutemberg nao e um estreante no contexto da comunidade cientifica, em face da sua intensa producao de artigos e teses cientificas, e como articulista de jornais, poeta e produtor de pecas teatrais. A expressao tipica do caboclo amazonense, esguio e musculoso, como devem ser os trabalhadores que vendem a sua forca de trabalho fisica, literalmente com um fardo sobre a cabeca, possivelmente castanha do Para ou borracha (caucho) made in Brazil, figurado na capa do livro (foto do autor), identifica visualmente imaginario da realidade concreta dos posseiros, assim como a sensibilidade, os sentimentos e a poesia da vida e obra de Gutemberg Guerra. O livro e resultado dos estudos e pesquisas feitas para a tese de mestrado do autor em Planejamento do Desenvolvimento - Plades - na Universidade Federal do Para. Esta organizado em suas 169 paginas, distribuidas em tres partes: a parte teorica (definicoes metodologicas e referencial teorico), a identificacao da area do estudo (a fronteira agricola no sudeste do Para) e a caracterizacao do posseiro na fronteira (a figura e identidade do posseiro) e as conclusoes. Sem perder rigor do metodo cientifico, autor coletou as suas informacoes de forma sistematica por meio da aplicacao de entrevistas com atores sociais especificos (lideres sindicais e posseiros) e de observacoes participantes em sindicatos selecionados: Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itupiranga, Jacunda e Maraba. Analises descritivas e qualitativas foram tambem efetuadas. A regiao de estudo, sudeste paraense, e identificada de um lado pelos conflitos entre grileiros e posseiros, seja pela violencia para a apropriacao e posse da terra rica em biodiversidade (madeira e plantas medicinais e aromaticas) e principalmente pela opulencia em minerais estrategicos a exemplo do ferro. O autor mostra estas contradicoes com riqueza teorica e historica ao afirmar a persistente luta entre posseiros e concessionarios da terra, desdobrada desde os indios, primeiros habitantes da regiao, ate as empresas capitalistas constituidas sob os subsidios estatais na egide da chamada modernizacao dolorosa. Em suas proprias palavras ele escreve que posseiro tem, historicamente, desenvolvido uma relacao com a terra, ate aqui, se da pelo dominio da atividade latifundiaria no campo que procura evidenciar a fragilidade da posse. Traz argumento embutido na Lei de 1850 que e retomado como afirmacao da grande empresa, teoricamente eficiente, contra campones, teoricamente representante do arcaico e pouco produtivo, e contra arrendamento por ser uma solucao primitiva (p. 53). Ademais e discutida com originalidade a participacao da mulher nas acoes de luta pela terra, nao como normalmente e abordado como companheira, mae e trabalhadora, mas a relevância do seu papel como participante ativa no sindical de trabalhadores rurais e nas organizacoes populares ... [onde] a mulher aparece com um destaque especial, talvez por influencia das reflexoes feitas no seio do movimento sindical, e no proprio entendimento com suas companheiras (p. 143 e 144). Sem assumir um claro alinhamento teorico, embora apresente mais proximidade com as teses estruturalistas e marxistas, livro enfatiza persistente debate desenvolvido por intelectuais de grande respeitabilidade e ate entao sem a unidade de conceito. Isto significa nao apenas diferencas no campo academico, mas assume dimensoes praticas que envolvem a estrategia de atuacao dos movimentos sociais, a exemplo dos sindicatos rurais. O que implica dizer que, para academicos como Jacob Gorender e Andre Gunder Frank, processo de colonizacao do Brasil foi parte do sistema capitalista mundial, enquanto para Alberto Passos Guimaraes e Werneck Sodre a colonizacao caracterizou-se por tracos feudais, como a existencia de um campesinato a exemplo do que existiu na Europa. Na busca de encontrar a unidade de caracterizacao do posseiro e a luta pela terra, mesmo sem a pretensao de estreitar os seus conceitos, autor apresenta abordagens diversas, como as sociologicas, juridicas (proprias dos dogmas do direito) - sem referencia ao estatuto da terra -, e politicas. A tentativa e contribuir para a identificacao desta complexa categoria social: posseiro da fronteira amazonica. Nao e uma tarefa facil, mas autor, na sua autoridade intelectual, arrisca-se a defini-lo como: o posseiro e aquele que luta coletivamente pela terra, dela tirando seu sustento ... posseiro esta como que a meio caminho do sem-terra e do proprietario (p. 17). Finalmente, livro apresenta contribuicoes importantes para aqueles que desejam conhecer a problematica da luta pela terra na fronteira amazonica, incluindo os posseiros e as suas representacoes sindicais. E um enfoque original, valioso e indispensavel para os estudiosos das questoes agrarias e sociais brasileiras. Indica-se para professores, extensionistas, estudantes, formuladores de politicas e principalmente pesquisadores que formulam problemas de pesquisa e testam hipoteses cientificas no contexto dos estudos sobre a ocupacao agropecuaria das fronteiras nacionais. Ficaria mais completo se trouxesse em seus capitulos contribuicoes relacionadas ao papel do Estado, da globalizacao, da modernizacao e do conhecimento cientifico advindo da pesquisa agropecuaria oficial. E um trabalho complexo e dialetico. Registre-se a grandeza intelectual dos apresentadores e prefaciadores do livro: Professores Jean Hebette, Luis Eduado Aragon, Jane Felipe Beltrao e Francisco de Assis Costa.
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