Poder e cumplicidade
1998; Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa; Volume: 33; Issue: 146 Linguagem: Português
ISSN
2182-2999
Autores Tópico(s)Social and Economic Solidarity
ResumoContudo, abordarei estas questoes fazendo uma pergunta: qual e a relacao entre poder e cumplicidade? Digamos que o poder e a capacidade de assegurar a complacencia de outrem em aspectos significativos, isto e, que afectam os interesses de cada um. Dois tipos de poder levantam dificuldades teoricas e empiricas particularmente complicadas, nomeadamente dificuldades em identificar a eficacia causal (por exemplo, o que e resultado de determinantes estruturais e o que e resultado da accao ou inaccao dos agentes; ele saltou ou foi empurrado?) e dificuldades de interpretacao do comportamento (ele esta a acenar ou a afogar-se?). Um dos tipos e aquilo a que o amigo de Montesquieu, La Boetie, chamou «servidao voluntaria». Por que razao as pessoas aceitam com condescendencia um poder que prejudica os seus interesses? Por que sera, como perguntou Wilhelm Reich, que «a maioria dos que tem fome nao roubam e [...] a maioria dos que sao explorados nao fazem greve»? Sobre esta questao, varias versoes das teses da ideologia dominante competem com varias solucoes do problema da accao colectiva, baseadas na escolha racional. Mas e sobre o segundo tipo de poder que quero concentrar-me aqui. Chamo-lhe cumplicidade. Por que condescendem as pessoas com um poder que as envolve nas profundezas do mal, fazendo-as agir desumanamente e infligir humilhacoes, e pior, matar outros seres humanos? Este e um tema que tem sido mais frequentemente tratado, nao por sociologos, mas por cineastas, biografos, historiadores, filosofos e juristas. E a questao central, por exemplo, de filmes como Le chagrin et la pitie, A Lista
Referência(s)